17 de dezembro de 2015

Caos na saúde do RJ? Chamem as Forças Armadas!

Pezão quer médicos das Forças Armadas e da PM nos hospitais
A solicitação foi encaminhada ao Ministério da Defesa
POR ANTÔNIO WERNECK / CARINA BACELAR / DARLAN DE AZEVEDO
RIO - Num cenário de crise na saúde, em que funcionários estão com salários atrasados e faltam desde materiais básicos a refeições, o governador Luiz Fernando Pezão decidiu recorrer à ajuda militar. Ele pediu o reforço de médicos e enfermeiros das três Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) para unidades da rede estadual. A solicitação foi encaminhada ao Ministério da Defesa. Além disso, Pezão convocou profissionais da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros.
- Fiz o pedido diretamente ao ministro da Defesa (Aldo Rebelo). Eles ficariam de prontidão para uma eventual necessidade. O pedido foi feito, mas ainda não recebi uma resposta - contou o governador. - Já estamos mobilizando também médicos e enfermeiros da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros.
O GLOBO procurou o ministro da Defesa para comentar o pedido, mas ele estava viajando. Já a assessoria de imprensa do Exército disse que não havia sido informada sobre a questão.
Antes de o governo solicitar o apoio dos militares, em conversas com entidades da classe médica o secretário estadual de Saúde, Felipe Peixoto, cogitou "referenciar" os hospitais mais prejudicados - isto é, fechar suas emergências e suspender a transferência de novos pacientes para as unidades. Os atingidos seriam os hospitais Getúlio Vargas (Penha), Albert Schweitzer (Relengo), Alberto Torres (São Gonçalo), Adão Pereira Nunes (Duque de Caxias) e Azevedo Lima (Niterói).
Segundo fontes da Secretaria de Saúde, seriam necessários ao menos R$ 500 milhões, até o fim do ano, para aliviar a situação dos hospitais. A pasta deve virar o ano com R$ 1 bilhão de dívidas (restos a pagar). Dos R$ 5 bilhões do orçamento da saúde estadual de 2015, só R$ 3,5 bilhões foram pagos.
Enquanto a ajuda não vem, a situação dos hospitais inspira cuidados. Integrantes do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio (Cremerj) se reuniram ontem com cem profissionais do Getúlio Vargas. Ali, as cirurgias eletivas (não emergenciais) do setor de ortopedia foram suspensas, já que, por falta de pagamento, parte dos médicos contratados pela organização social Pró Saúde cruzaram os braços. A unidade ameaça suspender também os atendimentos de emergência e os procedimentos do setor de pediatria, segundo informou o Cremerj.
- Eles chegaram a dizer que, caso a situação permaneça, a perspectiva é fechar a emergência - disse o vice-presidente do Cremerj, Nelson Nahon. - Achamos que seria errado referenciar as emergências. Os pacientes vão para onde? É colocar em grave risco a população.
A entidade recebeu uma carta assinada por médicos do Hospital Adão Pereira Nunes, informando que 30 pacientes aguardam cirurgia ortopédica na unidade. Os procedimentos foram suspensos por falta de insumos. No hospital de Caxias, os profissionais também são contratados da Pró Saúde. Tanto ali como no Getúlio Vargas, segundo o Cremerj, os médicos estão sem receber há dois meses.
A precariedade também marca o dia a dia no Hospital Alberto Torres. Pacientes e funcionários relatam problemas no estoque de medicamentos, horários irregulares para almoço (por falta de comida) e escassez de materiais essenciais para a realização de cirurgias. Os terceirizados são funcionários da organização social Instituto Sócrates Guanaes (ISG), que, desde 2012, administra, além da unidade de São Gonçalo, o Centro de Trauma, na mesma área, e o Hospital Estadual Prefeito João Batista Cáfaro, em Itaboraí.
A emergência do Alberto Torres funciona com problemas. Na quarta-feira à tarde, a médica responsável pelo atendimento passou mal e, por mais de uma hora, ela ficou sem substituto no setor.
Os funcionários terceirizados contam não ter recebido o pagamento referente a novembro.
- Estamos tentando trabalhar, mas ninguém conversou até agora conosco sobre a previsão para os pagamentos. Muitos colegas abandonaram seus postos, pois não têm mais como arcar com passagens e almoço, nem como trabalhar em condições tão precárias - contou uma funcionária da área de enfermagem.
De acordo com familiares de pacientes internados no hospital, as cirurgias estão atrasadas.
- Meu marido está desde domingo aguardando que os médicos operem o braço dele. Ele precisa de cinco pinos, mas eles nos dizem que não existe previsão para realizar a cirurgia, porque não há bisturi e outros materiais - contou a dona de casa Adriana Guimarães, de 48 anos.
Algumas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) já pararam por falta de condições de trabalho e por atrasos tanto nos vencimentos de médicos, como nos de agentes de segurança e recepcionistas. "Esta UPA não está funcionando por falta de pagamento de salários!", informa um cartaz afixado no portão da unidade de Realengo.
Em relatos enviados ao Sindicato dos Médicos do Estado do Rio de Janeiro, profissionais reclamam da falta de condições de trabalho nas UPAs do governo estadual. "A unidade tem problemas estruturais. Macas quebradas na sala amarela, falta de antibióticos e outras medicações na farmácia, aparelhos antigos na sala vermelha. Não temos a menor segurança e por diversas vezes há tumultos e agressões físicas e verbais contra os funcionários", contou uma plantonista da UPA Duque de Caxias I, em Parque Lafaiete. Ela acrescentou que os atendimentos serão restritos a pacientes em estado grave. A unidade é administrada pelo Instituto Data Rio.
Em nota, a Secretaria estadual de Saúde disse que, "diante da crise financeira do estado, vem reunindo esforços, dia a dia, junto às secretarias municipais de Saúde, ao Ministério da Saúde, a outros órgãos do governo do estado e até à iniciativa privada, para manter suas unidades funcionando, no intuito de minimizar ao máximo possível os transtornos à população". O órgão afirmou que o cenário só deverá se normalizar com repasses para o Fundo Estadual de Saúde.
O GLOBO/montedo.com