12 de janeiro de 2010

DIREITOS DOS MANOS: LULA TENTA CONSERTAR O ESTRAGO

Lula recua e tenta conter crise
Para atender a militares, presidente manda alterar expressão no decreto da Comissão da Verdade

De Gerson Camarotti:
Para tentar encerrar a crise deflagrada no governo com o lançamento do novo Programa Nacional dos Direitos Humanos, que trata dos mais variados temas e defende aprovação de 27 novas leis, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve determinar uma alteração no texto do decreto que previa a criação da Comissão Nacional da Verdade para investigar atos cometidos durante a ditadura militar.
Atendendo a pedido do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e dos comandantes militares, a frase que justificava a criação da comissão deve ser mudada. A versão original diz que a comissão vai apurar violações de direitos humanos "praticadas no contexto da repressão política". Na nova versão, entrará a expressão "praticadas no contexto de conflitos políticos".
No jargão das Forças Armadas, a mudança de expressão significa que a Comissão da Verdade investigará não só militares, mas também militantes da esquerda armada durante a ditadura. Antes de anunciar a decisão, Lula informou a auxiliares, na primeira reunião de coordenação política do ano, que conversará com os ministros Paulo Vannuchi (Secretaria de Direitos Humanos) e Jobim. A conversa deve ocorrer até amanhã. Lula deseja uma solução negociada, sem traumas. Segundo integrantes do governo, ele determinara a Vannuchi a substituição da expressão antes de ir a Copenhague, em dezembro.
Lula também ordenará mudanças no trecho sobre aborto. Não se falou na reunião, porém, em alteração de outros pontos polêmicos: a criação de um grupo para discutir com o Congresso iniciativas propondo a revogação de leis remanescentes da ditadura e que tenham sustentado violações — ponto interpretado pelos militares como brecha para rever a Lei da Anistia — e a mudança nos critérios de concessão de rádios e TVs.

Lula teria pedido a mudança do texto sobre a Comissão da Verdade durante uma escala de voo que fez em Natal, no dia 15 de dezembro, depois de ter sido alertado por Jobim. Lula acionou seu chefe de gabinete, Gilberto Carvalho, para falar com Vannuchi, mas este alegou que o texto já estava na gráfica e não dava mais para fazer a alteração.
O episódio foi confirmado ao GLOBO pelo deputado Raul Jungmann (PPS-PE), que conversou com Vannuchi semana passada. Mas, apesar da alegação de Vannuchi, o governo ainda poderia ter mudado o decreto, que só foi editado em 21 de dezembro. O texto acabou sendo publicado sem alteração, e os comandantes das Forças Armadas reagiram com um pedido de demissão coletiva.
O GLOBO