19 de janeiro de 2010

HAITI: SARGENTO FALA SOBRE O TERREMOTO

Sargento brasileiro relata momentos de emoção após terremoto

Em uma situação de guerra, conflito ou tragédia, onde soldados trabalham no limite horas a fio, é difícil perceber que por baixo da farda, colete, capacete, botas, há um ser humano. Em entrevista ao iG, o sargento Cunha, na base brasileira do Haiti, admitiu: soldado também chora. Motivos para tanto não faltaram. Pouco depois de comemorar seu aniversário, o terremoto que arrasou Porto Príncipe matou o seu amigo tenente-coronel Marcus Vinícius Macedo Cysneiros, que estava na sede da Minustah e foi encontrado nesta segunda-feira.
Há 27 anos no Exército, sete meses no Haiti, Cunha jamais vivenciou um evento como o do dia 12 de janeiro. Ela relata como foram os primeiro momentos na base brasileira e a festa pelos seus 46 anos no dia 8, com Cysneiros. "Foi meu aniversário no dia 8 de janeiro e todos os amigos fizeram aqui uma festinha. O coronel Cysneiros, muito amigo, foi lá, mas eu saí cedo, estava com muita dor de cabeça e fui dormir. Aí ele me encontrou no dia 12 ele veio me cobrar: 'Cunha, fui lá na sua festa mas você não estava! Vamos ter de fazer outra'. Aí ele foi para o prédio da Minustah. Foi quando ocorreu o terremoto. Rezo muito por ele", disse Cunha.

Sargento Cunha posa para fotos no Haiti / Foto: Vicente Seda
O sargento disse estar orgulhoso da postura dos soldados na hora do terremoto. "Todos deram o melhor de si. Eu nunca tinha passado por isso. A situação aqui no Haiti estava muito boa, tinha mudado muito.

Esssa tragédia foi para arrebentar. No início, depois do tremor, o comando já reuniu toda a tropa. Quem já passou por terremotos sentiu que era muito forte, mas para mim foi uma surpresa. O comandante na hora falou: 'Deve ter gente morrendo por aí, vamos organizar rapidamente'. Aí já começou a aparecer pessoas muito machucadas, amputadas inclusive aqui fora da base, e virou uma correria só. O pessoal foi pra cima, tem de tirar o chapéu, trabalharam muito", relatou.
Após a adrenalina, conter as lágrimas seria, segundo ele, tarefa para superhomem. E, no Haiti, não se trata de história em quadrinhos. "Chorar é normal, é um sentimento normal. Não existe superhomem, somos humanos. Na hora você não chora, passa por um monte de coisas, tem de se virar, mas em um determinado momento descem as lágrimas. Não vou dizer que chorei copiosamente, mas desceram lágrimas. Porque a gente fica impotente, você fica com aquela vontade de fazer mais do que está fazendo. Depois, falei com a minha filha (tem quatro filhos no total) de sete anos. Expliquei que tinha de ajudar as pessoas. Ela disse: 'então ajuda papai, mas volta para casa, quero você aqui'. Mas ela começou a chorar, tem sete anos, aí também desabei".
Outra imagem que não sai da cabeça do sargento é a de uma criança haitiana que chegou à base pouco depois do terremoto, sem um dos braços. "Ele estava sem o bracinho, tentando acenar por ajuda. Quando os soldados foram e começaram a tratar, ele sorriu, apesar de toda a dor".

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