Antônio Rocha A última semana foi emblemática para o Brasil ter uma dimensão de como se constroem heróis no país. Corremos sério risco, no mundo midiático em que vivemos, de confundir os valores e transformar artistas, políticos e personagens da telinha em heróis. Ancorados em programas nos principais canais de televisão, um grupo de aventureiros se presta a saciar o voyeurismo dos telespectadores, se expondo ao ridículo. De Brasília, vêm imagens chocantes de políticos discutindo como repartir ou guardar o botim com o dinheiro público do Distrito Federal. Os noticiários de TV também nos remetem à crua realidade do mundo dos crimes, catástrofes e tragédias, como o terremoto no Haiti. No meio do caos e das cenas dramáticas de um povo que não tinha mais nada para perder, sobressaiu a atuação dos militares brasileiros. Estes sim, os verdadeiros heróis do país. Longe das famílias e vivendo numa terra sem as mínimas condições de conforto, eles dão dignidade ao Brasil. Levam um pouco de esperança e paz a um povo explorado e massacrado desde o século XIX. Aqui, a TV nos empurra programas simplórios, que vivem de fofocas e bisbilhotar performances pessoais pouco exemplares, em horário nobre, como se a sociedade não tivesse coisas mais sérias para se ocupar. Além de ter-se apropriado do personagem de George Orwell, ainda temos que aturar o apresentador do big-brother tupiniquim, chamá-los de “nossos heróis”. Heróis de quem? Os políticos posam de vítimas, depois de terem sido pegos no flagrante. E mais: sem qualquer constrangimento, lutam para se manter no cargo e ludibriar a justiça. Esse big brother do dinheiro nas meias é tão deprimente quanto o outro, que alimenta uma audiência sequiosa de cenas e diálogos de baixo nível. Entre a desfaçatez de uns e as bobagens de outros, quem perde é o telespectador brasileiro, que não tem para onde correr. Não se sabe o que é mais chocante. Se as baboseiras expostas em discursos vulgares e limitados dos protagonistas da “casa”. Ou as cenas dos ladrões de colarinho branco, eleitos para governar e legislar e não para roubar. Ainda bem que temos o contraponto, para desmistificar esses heróis de araque, que saem dali para páginas de revistas masculinas ou femininas, para alimentar o círculo vazio da indústria cultural de celebridades fabricadas. Ou, no caso dos políticos, circulam nas festas da corte e nas rodas oficiais com a mesma cara de pau com que aparecem nos vídeos guardando o dinheiro na cueca ou nas meias. Minutos antes, os programas jornalísticos nos mostram os heróis de fato, dentro e fora do país. Como Zilda Arns. Não satisfeita com tudo o que fez aqui, nos últimos 30 anos, para reduzir a mortalidade infantil, estava lá, no exterior, transmitindo ensinamentos para amenizar o calvário de populações pobres. Ao lado dela, meninos que entraram no Exército e resolveram abraçar uma empreitada difícil, levados por um ideal, em busca de crescimento pessoal e profissional. Lamentavelmente, foram colhidos pela tragédia e entram precocemente para a galeria dos heróis nacionais. É incrível o paradoxo da mídia eletrônica. De um lado escancara as aventuras nada edificantes de um grupo de políticos, metendo a mão no dinheiro do contribuinte, além das disputas amorosas e liberalidades físicas do grupo confinado que faz qualquer coisa para aparecer. De outro, é também a janela por onde conseguimos conhecer a verdadeira dimensão do trabalho dos jovens heróis brasileiros, que não tiveram tempo de contar sua história para pais, esposas, filhos ou netos. *Jornalista e Consultor de comunicação JORNAL FOLHA DO SUL (BAGÉ-RS) |
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