7 de janeiro de 2014

Por que o Gripen NG? Uma decisão técnica ou política?

JOÃO PAULO M. PEIXOTO*
“Política é tudo” – Aristóteles
Por que é o mais barato dos três concorrentes? Porque é o preferido da FAB? Porque ganhou dos outros dois, sendo um pelo custo e o outro por razões políticas que vão do antiamericanismo ao affaire Snowden? Porque apresentou o melhor preço para o pacote (USD 4,5 bilhões a longuíssimo prazo) aliado à irrestrita (e ainda que duvidosa) transferência irrestrita de tecnologia? Porque se encaixou politicamente no desejo do governo brasileiro em dar uma resposta ao norte-americano, ainda se prestando a um lance político? Uma vez que a decisão foi anunciada no mesmo dia em que o Congresso Nacional, na presença da presidente Dilma, devolveu simbolicamente, em sessão solene, o mandato do ex-presidente João Goulart. Ainda mais tendo a presidente participado antes de um almoço com os oficiais generais em Brasília. Como se vê, não faltam argumentos políticos e técnicos para justificar a escolha final.
Bem, o fato é que ao cabo de um processo que durou mais de 10 anos o atual governo anunciou a compra de 36 (podendo chegar a 120 em 2023) jatos suecos Gripen NG, do grupo SAAB, para reequipar a Força Aérea Brasileira.
Muito se debateu sob os ângulos político, econômico e militar o projeto FX-2, destinado a fornecer jatos de combate para a Força Aérea Brasileira. As vantagens e desvantagens dos três concorrentes – o F-18 Super Hornet, fabricado pela norte-americana Boeing; os jatos Rafale F3 da francesa Dassault; e os suecos Greepen NG do grupo SAAB foram objeto de sucessivas análises.
A respeito do Rafale F3 da Dassault, argumentava-se que esses caças franceses tem sido um produto de difícil comercialização. O que leva a crer que precisaria ser comprado pelo próprio país que o produziu. Ou seja, mais parece uma espécie de versão militar do civil Concorde. Além de ser o mais caro de todos os concorrentes.
A seu favor, no entanto, pesavam as históricas relações políticas, econômicas e culturais entre os dois países. Além do que, culturalmente, o Brasil sempre esteve muito ligado aos europeus. Não só pelo fascínio e identidade de nossas elites com a cultura e o modo de ser europeu mas, particularmente, com o francês.
Ademais, nem mesmo o fato das doutrinas militares francesas oriundas da Primeira Guerra Mundial terem influenciado as primeiras gerações de oficiais brasileiros até 1945, chegando a servir para denominar um grupo de generais (Golbery, Geisel e Castelo Branco entre outros) como o “grupo da Sorbonne” foi suficiente para sensibilizar a FAB e o governo.
Os americanos, por sua vez, mesmo tendo capturado as preferências dos brasileiros após a Segunda Guerra Mundial, onde o Brasil se fez presente pelo contingente da FEB, que lutou na Itália junto ao 4º. Corpo do V Exército Americano, e, portanto, com os aliados contra o eixo nazifascista também não convenceu. Mesmo considerando que essa aproximação se deu doutrinariamente e na forma de material bélico.
Nem ainda o fato do caça F-18 Super Hornet fabricado pela Boeing, já ter sido largamente testado e aprovado em combate, com centenas deles voando e equipando forças militares mundo afora, foi argumento igualmente suficiente para convencer o governo brasileiro.
Todos esses fatores, somados ao – até recentemente – período de lua-de-mel diplomático entre os governos do Brasil e dos EUA também não serviram para a escolha da aeronave da Boeing, que parecia ser a melhor opção tanto do ponto de vista político como militar e ainda sob a rubrica do custo x benefício.
Por último o Gripen NG. A respeito dele, considerados todos os aspectos envolvidos na decisão, havia mais dúvidas do que certezas. Variando dos aspectos técnicos; por exemplo, dispor de apenas 1 turbina, possuir menos ‘poder de fogo’, e principalmente ao fato de ainda não existir materialmente falando, mas constituir-se ainda num protótipo a ser desenvolvido, às questões políticas do tipo: quais as identidades históricas, políticas, culturais e militares entre Brasil e Suécia que proporcionariam melhores bases do que com os americanos e franceses para uma parceria estratégica no campo militar?
A seu favor, o menor preço e a propalada e polêmica transferência total de tecnologia, abrindo um novo e, de certa forma desconhecido, campo de cooperação estratégica com os suecos no campo militar.
Mas, mesmo depois de anunciada e ainda não concretizada decisão, é razoável que ainda se tema uma não improvável reviravolta no processo, como outras que já ocorreram nesta e em outras decisões governamentais. Mais ainda se considerado o histórico de instabilidade administrativa e na implementação de políticas públicas, principalmente levando-se em conta o cenário político (ano eleitoral) e econômico para 2014.
Por fim, não custa lembrar que o projeto FX-2 parece ter sido concebido inicialmente para viabilizar a compra de 36 aviões de caça e não para a construção deles. Uma vez que há anos se sabia das urgentes necessidades de reposição dos Mirage 2000, finalmente aposentado ao final do ano passado. Aliás, ironicamente substituído por um caça mais antigo ainda, o F5.
Desse jeito, não resta à FAB (e a nossa Defesa Aérea) continuar a esperar pela legítima e necessária modernização da sua aviação de caça.
*Professor e pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Governo e Administração Pública da Universidade de Brasília