4 de fevereiro de 2012

Centro Tecnológico do Exército: 30 anos delineando o Exército do futuro

Rafael Sayão
O nascimento de um gigante da pesquisa no Brasil
Em 1762, quando o Vice-Rei Gomes Freire de Andrade, o Conde Bobadela, fundou a Casa do Trem de Artilharia, no Rio de Janeiro, com o objetivo de suprir as necessidades de defesa do Brasil, não podia imaginar que um dos mais respeitados centros de pesquisa do setor seria instalado, no mesmo estado, 217 anos depois. Criado por meio do Decreto nº 84.095, de 16 de outubro de 1979, o CTEx tem sua origem idealizada bem antes disso. Na década de 40, com a vinda de missões militares dos Estados Unidos ao Brasil e a chegada de equipamentos militares oriundos daquele país. O Ministro da Guerra buscando dar nova forma aos setores de pesquisa e desenvolvimento de materiais de interesse do Exército, e capacitar a indústria nacional de defesa para produção de material similar ao americano, criou organizações militares que proporcionariam ao Exército um grande crescimento tecno-científico.
Foram criados o Instituto Militar de Tecnologia (IMT), o Serviço de Tecnologia (ST), o Arsenal da Urca e várias fábricas militares. O IMT buscava reunir em um só estabelecimento os diversos laboratórios de ensaios e pesquisa e, em 1959, ao se fundir com a Escola Técnica do Exército (EsTE) deu origem ao IME. O Serviço de Tecnologia (ST) era o órgão do Exército responsável por centralizar todos os assuntos relativos a estudos técnicos, científicos e industriais. No ano de 1980, sob a designação de Diretoria de Pesquisa e Ensino Técnico, foi transferido para o CTEx.
O Arsenal da Urca é resultado do trabalho das oficinas da Escola de Artilharia de Costa na reparação de materiais e já foi responsável pela usinagem de foguetes e fabricação de suas plataformas lançadoras (108R e 81E), sendo extinto e incorporado ao Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento em 1973.
Até a criação do CTEx, a pesquisa tecnológica e desenvolvimento de matérias no Exército era feita de forma dispersa em Arsenais de Guerra e fábricas militares espalhadas pelo Brasil. A centralização destas atividades surge como fator preponderante para o desenvolvimento da pesquisa e do desenvolvimento tecno-científico no Exército. Para o estabelecimento deste centro, foi criada a Comissão Executiva de Implantação do Cento Tecnológico do Exército (CEICTEx) que teve como missão inicial encontrar uma área de no mínimo 20 quilômetros quadrados, localizada entre Rio, São Paulo ou Minas Gerais e que tivesse facilidade de obtenção de água e energia elétrica. A área escolhida, em Guaratiba (RJ), era inicialmente da Marinha do Brasil, sendo transferida para a 1ª Região Militar em 1979. A proximidade com o Campo de Provas da Marambaia tornava o local ainda mais apropriado, já que o desenvolvimento de foguetes estava nas principais pranchetas de pesquisa do Exército.
Era o início da maior organização militar do Brasil voltada para a pesquisa e desenvolvimento de material de emprego militar.

O Centro Tecnológico do Exército
O CTEx é uma organização militar integrante do Sistema de Ciência e Tecnologia do Exército, subordinado ao Departamento de Ciência e Tecnologia, desde 2005, que tem a missão de realizar pesquisa científica, desenvolvimento experimental, assessoramento científico-tecnológico e aplicação do conhecimento visando a obtenção de produtos de defesa de interesse do Exército.
Ocupando uma área de 25.667.715,54 m², no bairro de Guaratiba, no Rio de Janeiro, o CTEX abriga técnicos e engenheiros civis e militares no cumprimento de sua missão, de desenvolver projetos e avanços tecnológicos que venham a garantir o poder dissuasório e a operacionalidade a força terrestre.
Os projetos desenvolvidos hoje no Centro Tecnológico do Exército abrangem diversas áreas do conhecimento e se caracterizam por sua multidisciplinaridade assim como pelas parcerias com agências de fomento, universidades, instituições de ciência e tecnologia e empresas da iniciativa privada.
As linhas de pesquisa desenvolvida nos diversos laboratórios do CTEx atendem as demandas dos projetos em cursos. Atualmente, o Centro Tecnológico do Exército possui 16 laboratórios com certificação internacional: Laboratório de análises químicas; laboratório de química militar; laboratório de defesa química; laboratório de processamento de alimentos; laboratório de materiais; laboratório de optrônicos e sensores; laboratório de medidas eletromagnéticas; laboratório de irradiação de materiais; laboratório biológico nível P2; laboratório de radiometria; laboratório de cromatografia, infra-vermelho e análise elementar; laboratório de simulação computacional; laboratório de reometria; laboratório de análises térmicas; e laboratório de análises físico-químicas. O objetivo futuro do CTEx é que todos estes laboratórios sejam certificados pelo Inmetro de forma que possam ser utilizados por universidades de todo o Brasil, afirmando mais uma vez a vocação do CTEx como referência no desenvolvimento de pesquisa de ponta no Brasil.
Uma das unidades mais críticas e importantes do centro, a Divisão de Defesa Química, Biológica e Nuclear do CTEx, trabalha na pesquisa e no desenvolvimento de materiais, serviços e informações científicas e tecnológicas referentes à DQBN. Suas missões incluem o assessoramento tecno-científico em defesa química, biológica e nuclear, sensoriamento, proteção e descontaminação química, biológica e nuclear e irradiação de material. Órgãos públicos e privados buscam assessoramento e formação nos cursos e treinamentos oferecidos no Centro Tecnológico do Exército. Com a proximidade de grandes eventos esportivos no país, já iniciando com os Jogos Mundiais Militares este ano, os conhecimentos desenvolvidos e transmitidos pela Seção de Defesa Nuclear, serão úteis na segurança geral da população e das delegações envolvidas nos eventos.
Consciente de ocupar uma área de imensa riqueza natural e composta por ecossistema de mangue, o CTEx luta bravamente para manter a área livre de invasões e ocupação desordenada. Ao se caminhar pelo vasto território do centro é possível o contato com espécies de aves raras de se ver em uma cidade como o Rio de Janeiro.
Em uma das lagoas perto do mangue, militares juram morar pelo menos meia dúzia de jacarés. Na vasta área de mangue, uma das mais preservadas do estado, é possível encontrar várias espécies de caranguejos que caminham livremente sem medo de serem caçados. Promovendo o replantio das mudas de espécies nativas, o Exército prova que é possível um convívio harmonioso entre o desenvolvimento da tecnologia e a natureza.

Os projetos do CTEx
Atualmente o CTEx trabalha concomitantemente em diversas áreas de pesquisa e desenvolvimento: Armamentos e munições; engenharia de materiais; automação e robótica; mísseis e foguetes; propelentes, explosivos e pirotécnicos; veículos militares; veículos aéreos não tripulados (VANT); sistemas de comando e controle; sistemas de guerra eletrônica; ótica e optrônica; defesa química, biológica e nuclear; e tecnologia de telecomunicações e de informações. Nos últimos anos, importantes resultados e produtos vêm sendo obtidos das pesquisas desenvolvidas.
O Radar SABER M60, desenvolvido pelo CTEX e totalmente produzido no Brasil, possui a mais moderna tecnologia entre os equipamentos de sua classe existentes no mercado internacional. O radar destina-se a integrar um sistema de defesa antiaérea de baixa altura visando à proteção de pontos e áreas sensíveis, como indústrias, usinas e instalações governamentais. É integrável a sistemas de armas baseados em mísseis ou canhões antiaéreos e pode integrar-se ao Sistema de Defesa Aeroespacial Brasileiro (SISDABRA). Com baixo peso e elevada mobilidade, pode suportar todas as condições climáticas do continente sul-americano, o que o torna extremamente interessante também para possíveis compradores na América do Sul. Existem estudos no CTEX para a construção do Saber M200, um projeto já iniciado, que ainda encontra-se em fase de concepção e que pode ser adaptado para a utilização das três forças armadas.
Outros dois projetos desenvolvidos pelo centro no campo das comunicações são o MAGE-COM Veicular e o Módulo de Telemática Operacional (MTO). O MAGE-COM consiste em um sistema tático destinado a realizar missões de Medidas de Apoio à Guerra Eletrônica (MAGE) através da instalação de equipamentos de radiomonitoragem em viaturas militares de ¾ Ton. A integração física e logística dos equipamentos é feito sob rigorosos requisitos doutrinários de emprego da Guerra Eletrônica, que conferem ao MAGE-COM elevado grau de mobilidade e excelente desempenho na aquisição e localização eletrônica de sinais de radiofreqüência. Já o Módulo de Telemática Operacional (MTO) permite a comunicação de dados, voz e imagens no campo de batalha. Foi construído de modo a ser operado remotamente ou embarcado em uma viatura de comando e controle (VCC), possibilitando às comunicações militares via radio, integração á rede pública de telefonia fixa ou celular, transmissão de vídeos a dezenas de quilômetros, acesso a internet a até 100 km de distância da base de operações, emprego de tecnologia VoIPe integração a qualquer cenário remoto através de sistemas de comunicação via satélite. Projetos que são aliados de peso para o soldado do futuro.
Equipamentos para serem utilizados no combate propriamente dito também são desenvolvidos pelo CTEX. Nos últimos anos, pesquisas do centro neste campo permitiram o desenvolvimento de reparos de metralhadora, morteiros, armas leves anticarro e sistemas de mísseis.
Buscando promover uma nova dimensão à Força Terrestre e à defesa nacional, principalmente em missões de garantia da lei e da ordem e em combates urbanos de baixa intensidade, o centro desenvolveu o protótipo do REMAX, um reparo de metralhadora automatizado, único do tipo no Hemisfério Sul, projetado para ser utilizado em viaturas blindadas sobre rodas ou sobre lagartas, como os M113 e o Urutu. Pode suportar metralhadora calibre 7,62 mm ou .50’ e permite a observação da região de combate em 360º, reconhecimento e identificação dos alvos durante o dia e a noite, realizando o tiro com campo vertical de -20° a 60°, inclusive em movimento.
Os comandos são realizados pelo atirador no interior da viatura, através do sistema de gerenciamento de missão, constituído de câmera, monitor, punho e botões de comando eletrônicos. Para o soldado infante, um dos maiores temores no campo de batalha é o encontro com um blindado do inimigo. Atenta a esta demanda da força, os armamentos anticarros também estão no inventário de produtos desenvolvidos pelo Centro Tecnológico do Exército, através do ALAC e do MSS 1.2 AC.

O ALAC, desenvolvido em parceria com a Imbel e conhecido oficialmente como canhão sem recuo descartável de 84 mm, é uma arma leve anticarro projetada para uso individual, no combate anticarro aproximado. Com alça de mira retrátil e operada a partir do ombro do atirador, o ALAC possui mecanismo de disparo totalmente mecânico. Com um alcance útil bem superior ao ALAC, o Sistema MSS 1.2 AC tem como objetivo atender as características do combate moderno, onde é necessária grande mobilidade, elevada potência de fogo e capacidade de engajar diferentes tipos de alvos. O MSS 1.2 AC também pode ser empregado contra casamatas, pequenas construções, embarcações e helicópteros em voo pairado à baixa altura. O míssil é dotado de cabeça de guerra do tipo carga oca e sistema propulsivo de dois estágios. Seu guiamento em direção ao alvo é realizado por um feixe laser projetado no espaço pela unidade de tiro. Para tanto, esta unidade possui dois sistemas ópticos independentes e colimados: a óptica de apontamento, através da qual o atirador realiza a mira e cuja configuração é semelhante à de um periscópio, e a óptica do feixe laser, cuja função é projetar no espaço um feixe laser modulado, que guia o Míssil ao longo de toda sua trajetória.
Atento a necessidade de apoio de fogo para as forças de ação rápida em qualquer teatro de operações em que se estiver operando, o CTEX desenvolveu três tipos de morteiros: o morteiro pesado 120mm M2 Raiado; o morteiro médio antecarga 81mm e o morteiro leve antecarga 60mm. O 120mm M2 raiado, possui grande potência de fogo e pode ser transportado por viatura ¾ ton, avião, helicóptero ou lançado de pára-quedas, o que garante mobilidade e flexibilidade ao emprego do armamento. Os morteiros leves antecarga de 60mm e 81mm (padrão OTAN), produzidos em parceria com o Arsenal de Guerra do Rio (AGR), tem como características a rusticidade, o baixo peso, a alta precisão e a facilidade de manejo, garantindo a possibilidade da manutenção de um elevado regime de tiro e efetivo apoio de foto aproximado aos pelotões de combate.
No campo das viaturas militares, o CTEx possui dois produtos que prometem entrar com força no mercado a que se destinam: o Gaúcho e o VEsPA. A viatura leve de emprego geral e aerotransportável Gaúcho é resultado do intercâmbio científico-tecnológico entre os Exércitos Brasileiro e Argentino. Com uma suspensão independente de grande curso nas 4 rodas e tração 4×4 aliada ao um potente motor, a viatura foi desenvolvida para atender às necessidades das Brigadas Paraquedistas de ambos os exércitos. Na Argentina, o veículo está sendo produzido no Batalhão 601, no Comando se Arsenales, em parceria com o Instituto Nacional de Tecnologia Industrial (INTI) e a Universidade Nacional de La Plata. O VLEGA Gaúcho está apto a cumprir missões de comando, transporte de carga, transporte de feridos, comunicações e reconhecimento. Sua robustez permite ainda o seu lançamento de pára-quedas através de aeronaves C-130 que podem transportar até 5 viaturas do tipo.
Outro projeto do CTEx no campo dos veículos militares, a Viatura Especial de Patrulhamento, VEsPA, foi desenvolvida especialmente para atender às necessidades doutrinárias das forças de segurança pública do estado do Rio de Janeiro. O projeto que levou em conta fatores como mobilidade, segurança, baixo custo e manutenção, foi apresentado ao Secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame em 09 de outubro de 2008. O VEsPA-01, utiliza um chassi Agrale modelo MA 6.0, motor 7 eletrônico MWM-International 4.07 TCE de 140cv e possui capacidade para transportar cinco policiais na frente e até seis presos na parte traseira, o veículo estreito, leve e ágil, permite manobras e incursões em locais de difícil acesso comuns nas comunidades do Rio e o patrulhamento ostensivo nas vias expressas da cidade. O modelo ficou a disposição da Secretaria de Segurança para testes em unidades como o BOPE e o Batalhão de Policiamento de Vias Especiais (BPVE), que preencheram questionários técnicos solicitados pelo CTEx e ofereceram todo o feedback necessário para o desenvolvimento do VEsPA-02 apresentado durante a LAAD 2011.

Responsável pela pesquisa e desenvolvimento de um VANT que atenda às necessidades operacionais da Força Terrestre, o centro trabalha no desenvolvimento de um veículo nacional que proporcionará menor dependência externa e baixo custo de manutenção. Com tantas opções de VANT no mercado, alguns inclusive em operação na Força Aérea Brasileira, questiona-se o desenvolvimento de um veículo pelo Exército Brasileiro. Contudo não podemos deixar de lado que um projeto como este pode impulsionar o desenvolvimento da indústria nacional de componentes eletrônicos, de softwares e de materiais correlatos, proporcionando um futuro domínio destas tecnologias. Objetivando a criação de um VANT que atenda a uma Divisão de Exército (DE) e os requisitos operacionais e técnicos estabelecidos pelo Estado Maior do Exército, o CTEx buscou a realização de etapas intermediárias de sistemas que possam servir de demonstradores de tecnologia rumo ao VANT almejado. Desse modo, surgiram as concepções do VANT VT 15, VANT VT 30 e VANT VT 70, com alcances de 15 km, 30 km e 70 km, respectivamente. 
O CTEx em parceria com a Flight Solutions, já desenvolveu o VT-15 que será empregado em aplicações de artilharia, em operações de garantia da lei e da ordem (GLO), operações psicológicas, reconhecimento tático e vigilância do terreno a uma distância de até 15 km e uma autonomia de duas horas de vôo. Em novembro de 2010, durante o Exercício Agulhas Negras, o Exército realizou o primeiro teste do VANT VT 15 em um treinamento real sobrevoando os céus de Pirassununga realizando reconhecimento do terreno e localizando tropas inimigas.
Revista Operacional/montedo.com

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