7 de março de 2010

UMA HISTÓRIA DE SOBREVIVENTES

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O texto a seguir foi extraído da revista Aerovisão número 225. A Aerovisão é uma publicação produzida pelo Centro de Comunicação Social da Aeronáutica (CECOMSAER), órgão do Comando da Aeronáutica. A matéria retrata a história do acidente e o posterior resgate dos sobreviventes do Cessna Caravan FAB 2725, ocorrido no final do ano passado.

Tenente-Jornalista Luiz Claudio Ferreira
Manaus, dezembro de 2009. Dois militares, ao acaso, reencontram-se em uma organização da Força Aérea Brasileira na capital amazonense. Ambos vestem uniforme camuflado. É um dia normal de trabalho. Já tinham se visto em outros dias normais de trabalho. Nesse encontro, carregado de emoção, as coisas não são como eram antes. Ao invés do natural aperto de mãos, os dois se abraçam. Estão frente a frente o resgateiro e o sobrevivente de um acidente aéreo. No dia 30 de outubro de 2009, esse abraço foi entremeado por lágrimas e sorrisos que eram ouvidos de longe. Era impossível não lembrar daquele momento único que vai marcar para sempre a vida dos dois. Um no socorro e o outro na certeza de ser encontrado. Personagens dessa história real, o Sargento Aldecy Silva Oliveira, profissional de resgate com 17 anos de serviço à FAB, tripulante do helicóptero H-60L Blackhawk, e o Tenente Carlos Wagner Veiga, piloto do C-98 (2725) acidentado na Região Amazônica, instrutor com mais de duas mil horas de vôo, viram a vida de forma diferente. Eles eram colegas. “Hoje somos irmãos, sem dúvidas”, concordam. Do momento do acidente ao instante único do resgate, cada um dos segundos se torna marco indefinível na vida de pessoas como eles.
Veiga e Aldecy estão entre os protagonistas de uma história impressionante que começou em meados de outubro de 2009. Ambos participavam de uma mesma missão: transportar sete profissionais da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), da área de enfermagem, para isoladas aldeias indígenas e vacinar mais de três mil brasileiros que vivem longe de postos de saúde. “É uma missão importante que temos a honra de participar”, disse Veiga dias depois. O comandante e mais três integrantes da tripulação do C-98 Caravan (FAB 2725), já haviam transportado os profissionais de Tabatinga (AM) para cidades onde era possível pousar com o avião. Até as aldeias, quem fazia o transporte era o helicóptero H60-L Black Hawk da FAB (FAB 8904), que tinha entre seus tripulantes o Sargento Aldecy. “Em nossas buscas, sabíamos que tentávamos encontrar os companheiros dessa linda missão. Já estávamos juntos havia 16 dias quando soubemos que a aeronave deles havia desaparecido. Quando encontramos, foi uma emoção do tamanho do mundo”, disse o resgateiro, que como tripulante é especializado também nos equipamentos elétricos do helicóptero.
texto-aerovisao-queda-caravan-2ACIDENTE - Para compreender a dificuldade da missão, é necessário voltar ao momento do pouso de emergência. Avião em pane, perda de potência do motor, os preparativos para o pouso de emergência, encontrar um pedaço de rio em meio ao “mar” de árvores de mais de 50 metros de altura… Na cabeça deles, conforme relataram, tudo demorou “pouquíssimos minutos”.
Mas o tempo foi o suficiente para atitudes imprescindíveis para que nove pessoas sobrevivessem. Quando houve perda de potência, o experiente mecânico Suboficial Marcelo dos Santos Dias disse que não havia nada mais a ser feito para que a aeronave permanecesse em voo. O Sargento Edmar Simões ratificou que era preciso procurar um lugar para fazer o pouso. Naquela área, as copas das árvores de mais de 50 metros de altura, de tão juntas, fecham-se e torna-se impossível avistar qualquer clareira. Um pouso em um local assim seria fatal para todos na aeronave.
Os pilotos contam que passaram, então, a procurar, visualmente e pelas cartas disponíveis, um rio. Durante esses minutos de aflição,fazia-se silêncio dentro da aeronave. Todos mantinham serenidade, a par do momento difícil. Veiga encontrou um rio estreito e sinuoso arranhando o “mar” verde formado pela floresta. “Vamos pousar”, disse Ananias. Todos já sabiam qual era a posição de impacto. Ficou acertado que a tripulação sairia pela frente e que os passageiros por trás.
Depois, o pouso no rio. “Graças à perícia impressionante dos pilotos”, “Eles foram nossos anjos da guarda”, disseram sobreviventes. O tempo para desembarcar da aeronave foi contado em segundos. Em instantes assim, pode haver distorção temporal, creem especialistas na área de aviação. Acreditam que seria improvável que 10 pessoas desembarcassem do aparelho se houvesse apenas poucos segundos até o equipamento afundar no Igarapé Jacurapá, no Rio Ituí.
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Nove sobreviventes nadaram cerca de 150 metros desde o local do pouso, no meio da água, até a margem do rio e enfrentaram a noite na floresta. O que seguiu a isso foi uma intensa procura com 12 aeronaves e mais de 300 militares. Em cerca de 24 horas, uma notícia era transmitida como se contam os milagres.
O RESGATE – Dentre tantas lembranças do resgate em todas as aeronaves que participaram da busca, uma luz especial a um grupo de militares tripulantes de uma aeronave C-105A Amazonas (FAB 2810), do Esquadrão Pelicano, sediado em Campo Grande. No avião, comandado pelo Capitão Santarém e pelo Tenente Sales (segundo piloto), houve busca intensa durante pelo menos seis horas seguidas no dia do desapa-recimento da aeronave. Naquela noite, nem conseguiram dormir direito. Achavam que estavam perto de encontrar. Acordaram ainda na madrugada e decolaram no nascer do sol. Partiram para o que viria a ser um dos melhores dias de suas vidas. Os militares especializados em busca e resgate costumam explicar que a idéia comum que se faz depois do acidente é que sempre existem sobreviventes e eles estão sofrendo. Só acreditam que não é possível salvar quando encontram o corpo de uma pessoa.
Depois de cerca de três horas de voo, a tripulação só via verde por todos os lados. Entretanto, os olhos do Sargento De Oliveira fixaram em um ponto. Ainda extasiado, passou a gritar de sua posição de observador na aeronave sobre o que seria a grande notícia. “Um sinal de fumaça!!! Fumaça, às 10 horas” (para indicar a posição ao piloto, imagina-se estar, como nos ponteiros do relógio numa coordenada imaginária às 12h).
“Fumaça, às 10h!!!”, repetia cada vez mais alto. Apreensão e euforia misturavam-se.. “Em pouco tempo, chegamos àquele local e avistamos as pessoas. Dentro do avião, gritávamos: achamos, achamos…” Era muita alegria.”, lembra o Tenente Tiago Gomes de Sales, de 27 anos.
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O avião continuou circulando a área indicando para os sobreviventes que eles haviam sido localizados. Nesse intervalo de tempo, a comunicação chegou ao helicóptero que estava mais próximo do local. Era o H-60L comandado pelo Tenente Roque e que tinha a bordo o Sargento Aldecy.
Ele relembra, muito emocionado,a rotina da tripulação da aeronave naquele dia. Também haviam acordado muito cedo e tinham recebido um informe da coordenação que um grupo de indígenas da tribo dos Matiis havia visto uma aeronave voar baixo próximo à aldeia. A tripulação conseguiu localizar a aldeia e, sem desligar o motor, Aldecy desceu da aeronave e conversou com pelo menos cinco índios sobre aquele informe. “Ninguém confirmou. Para nós, que atuamos com busca e resgate, qualquer informação é muito importante. Perguntei, então, qual era o rio mais próximo daquela área. Enquanto eles me mostravam no mapa o Rio Ituí, o restante da tripulação me acenava bastante para que voltasse ao helicóptero”, disse. O aceno foi o momento em que o C-105A Amazonas informava que a tripulação do Pelicano havia localizado os sobreviventes.
Depois de cinco minutos de voo, aproximadamente, o helicóptero chegava ao local apontado. “Vimos sacos de ração, mosquiteiros, coletes amarelos fluorescentes e os sobreviventes pulando, acenando. Foi um momento, de fato, maravilhoso”. Como o helicóptero estava antes encarregado da missão de transporte da equipe da FUNASA e havia, por força das circunstâncias, sido empenhado depois nas buscas, não estava equipado com guincho ou corda. O BlackHawk voou baixo, foi aproximando, abaixo da altura das árvores, 30 metros , 20 metros…10 metros… Seria necessário adotar a técnica do hellocasting, que é quando um integrante da tripulação salta do helicóptero em baixa velocidade para chegar aos sobreviventes.
Quando a aeronave chegou a pouco mais de cinco metros de altura, Aldecy garantiu que estava pronto para saltar. A porta foi aberta, ele sentou no piso da aeronave, segurava-se com as duas mãos… Um colega tocou no seu ombro. Era a hora. “Nunca tive dúvidas. Não via o momento de chegar perto deles. Quando eu pulei, a correnteza era muito forte. Para se ter uma ideia, mais rápido do que a velocidade do helicóptero. Era muito barrento, cheio de galhos. Nadei muito. Estava chorando enquanto nadava. Era muita emoção”. Aldecy chegou à margem. O cansaço só foi lembrado horas depois. A missão era ajudar e realizar o exame pré-hospitalar militar nos sobreviventes. Abraçou o Tenente Veiga e, na sequência, a enfermeira Josicléia Vanessa Almeida, grávida de três meses. “Era outro sobrevivente. O Aldecy ajoelhou, beijou a minha barriga. Naquele momento, éramos todos uma família”, disse a enfermeira.
Depois do contato inicial, Aldecy conteve a emoção. Fez os exames previstos para o grupo. “O socorro vai chegar em uma hora”, disse.. Três helicópteros chegaram para o resgate, sendo um do Exército, no qual embarcaram a maioria dos feridos apoiados por profi ssionais de resgates em guinchos.
Do BLOG PODER AÉREO

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