Relato diplomático expôs constrangimento com caso, que poderia ter ‘graves consequências’
FRANCISCO LEALI
BRASÍLIA - Em 21 de novembro, o telegrama 416 completou 25 anos. O documento carregava o carimbo de ultrassecreto. Se dependesse do Itamaraty, as quatro páginas do texto escrito pelo então embaixador do Brasil no Paraguai ficariam guardadas por mais 25 anos. Não ficaram. O telegrama de 1991 traz o relato de um aparentemente constrangido diplomata. Ele narra ter descoberto que os três adidos militares brasileiros estavam envolvidos em compras de carros importados com isenção e revenda ilegal para cidadãos do país. Na época, jornais locais denunciaram o esquema. Citavam políticos do Paraguai, sem menção a brasileiros.
A investigação cresceu, e nomes de diplomatas estrangeiros entraram na lista. Num encontro casual, relata o embaixador, foi avisado que um coronel do Exército, adido na embaixada, estaria na mesma situação. O diplomata relata então os diálogos que teve com o militar. O coronel admitiu ter comprado um BMW modelo 850 Coupe para uso pessoal, mas que fez um documento particular de promessa de venda em nome de um terceiro.
“O coronel... manifestou-me o dissabor por essa situação, de cuja gravidade passou a dar-se conta. Disse-me que encontrou instaurado esse sistema vigorando de longuíssima data em Assunção entre os adidos e que, meio à prática absolutamente generalizada que todos os paraguaios fazem de suas facilidades, deixou-se levar por ela”, contou o embaixador, acrescentando que a prática era comum no país. Foi, então, que o diplomata resolveu chamar os adidos da Marinha e da Aeronáutica que teriam feito “francos relatos”, confirmando a mesma prática, com uma diferença: os veículos continuaram registrados em seus nomes.
O diplomata conta ainda que a prática é tratada de maneira diferente no Paraguai e defendeu a atuação profissional dos adidos. Ele avisou que iria mostrar o texto do telegrama aos adidos e que os três fizeram um apelo para que, em virtude de “graves consequências às suas carreiras”, o caso não fosse formalizado no Brasil. Os nomes dos militares foram expostos, mas a identidade foi preservada pelo GLOBO.
O Globo/montedo.com