7 de novembro de 2009

MILITARES ACEITAM MAIOR PRESENÇA DO PODER CIVIL NAS FORÇAS ARMADAS


Promessa de orçamentos robustos e edição de novo plano estratégico agradam Exército, Aeronáutica e Marinha

Tânia Monteiro


Temas tabus nas Forças Armadas, o papel de "policial das fronteiras" e a submissão completa ao poder civil foram digeridos pela cúpula militar depois de um processo de negociação, comandado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim. A articulação envolveu a promessa de orçamentos mais robustos para Exército, Aeronáutica e Marinha e a edição de um novo plano estratégico ao gosto dos militares.
O resultado é que o governo, como apurou o Estado com fontes militares, não vai enfrentar maiores problemas na caserna durante a tramitação no Congresso da proposta de alteração da Lei Complementar 97, que estende para a FAB e Marinha o poder de polícia e dá mais poderes ao ministro da Defesa.
No campo político, para que as resistências às mudanças fossem as menores possíveis, Jobim dedicou os últimos meses a promover diversas reuniões com lideranças partidárias, além de integrantes das Comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara e do Senado.
O Estado antecipou ontem o texto que será encaminhado ao Congresso, segundo o qual as Forças Armadas estarão cobertas pela proteção legal para realizar operações típicas de manutenção da lei e da ordem. Pela proposta, em operações de vigilância na fronteira e demais ações ordenadas pelos Poderes constituídos, Exército, Marinha e Aeronáutica poderão revistar pessoas, veículos e instalações e fazer prisões em flagrante delito.
O projeto fortalece, ainda, o cargo de ministro da Defesa, que passa a ter comando operacional sobre as três Forças, que ficam, efetivamente, subordinadas ao poder civil. Segundo o novo texto, os comandantes das Forças passam a ter obrigação de apresentar ao ministro a lista de escolha dos militares a serem promovidos, assim como os nomes dos indicados para os respectivos cargos. No caso do emprego das Forças, a subordinação continua sendo ao presidente da República, comandante supremo, mas por intermédio do ministro da Defesa.
"Essas mudanças representam uma evolução natural de um primeiro momento, em que se criou o Ministério da Defesa em 1999", declarou o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa do Senado. "Reconhecemos que o Brasil precisa de uma nova estrutura de Defesa e existe um clima positivo para aprovar o projeto."
Já o deputado José Genoino (PT-SP) afirmou que as alterações no texto são "necessárias e corretas", acrescentando que elas visam a integrar as três Forças militarmente e nas questões orçamentárias. Genoino discorda, no entanto, da interpretação de que se dará poder de polícia para as Forças Armadas. Segundo ele, os militares, nesse caso, estarão cumprindo missões especiais, algumas de garantia da lei e da ordem.
Apesar de a maioria concordar com o novo texto, houve algumas duras críticas. Ex-comandante militar do Leste, o general Luiz Cesário da Silveira Filho, que foi para a reserva em março, classificou a proposta como "absurda", alegando que ela "vai reintroduzir o componente político" nas Forças Armadas.
Esse é o mesmo pensamento do presidente do Clube Naval, almirante Ricardo Veiga Cabral. Ambos entendem que a decisão de passar a escolha dos comandantes para o ministro vai levar instabilidade às Forças. "Daqui a pouco vai ter senador e deputado pedindo pela promoção de A ou B ou pedindo para remanejá-lo para este ou aquele local. Isso é uma ingerência descabida", atacou Cesário.

Comento:
A proposta, em si, é modernizadora e necessária, uma vez que não há sentido em manter-se uma estrutura independente em cada Força para fazer a mesma coisa. Em tese, a reestruturação proporcionará maior agilidade nas decisões e grande economia de recursos. Em tese, sim, pois o superfaturamento e a corrupção tendem a  aumentar astronomicamente nas negociatas bilionárias a serem geridas por um órgão civil (afinal, é o Brasil).
Mas essa não é a maior preocupação dos generais. Os estrelados lamentam a extinção de vários cargos de oficiais-generais que a mudança acarretará. Em consequencia, o funil para o generalato se estreitará ainda mais. Além, é óbvio, da perda de poder que a reestruturação representa.

Que o projeto tem um forte componente politico, é evidente. O problema  maior está na motivação ideológica por trás da proposta. A história já demonstrou sobejamente o quão a politização dos quartéis  tem sido nefasta, tanto para os fardados como para a naçao. Os generais de 64 conseguiram, a ferro e fogo, extirpar o componente político do cotidiano da tropa. Quatro décadas depois, este projeto ambíguo, motivado por ressentimentos que deveriam estar sepultados pelos bilhões em benesses distribuidos pela Comissão de Anistia, tenta reintroduzir a questão político-ideológica nos quartéis. 
O Rio Grande do Sul, sob o PT de Olívio Dutra, teve uma experiência desse tipo com a Brigada Militar. Os efeitos foram os mais nefatos possíveis e os brigadianos e o povo gaúcho sofreram muito com isso.
As consequências e desdobramentos da aplicação do novo projeto dependem muito do resultado da eleição presidencial.
Porém, uma coisa é certa: ganhe quem ganhar, o carreirismo predominante hoje nas Forças Armadas fará com que surjam muitos oficiais dispostos a seguir direitinho a cartilha ideológica que tende a ser implantada nos quartéis.

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