Combate à biopirataria, governo joga a toalha
Augusto César Martins de Oliveira*
No biênio 1999/2000, encontrava-me prestando serviço no Comando de Fronteira Roraima/7° Batalhão de Infantaria de Selva, na função de fiscal administrativo, ou seja, responsável pela logística da sua sede, na cidade de Boa Vista, e dos seus cinco Pelotões Especiais de Fronteira (PEF), destacados nas localidades de Auris, Surucucus, Bonfim, Normandia e Pacaraima.
No cumprimento da minha missão, visitei, com certa frequência, aquelas vilas e mantive um excelente relacionamento com as autoridades locais, fazendeiros e comunidades indígenas. É bem verdade que fatos estranhos aconteciam, como a restrição pela Funai de casamentos de não-indígenas com indígenas e o fechamento diário por 12 horas (das 18h às 6h) da BR-174, que possui cerca de 800 km e que liga as capitais Manaus/AM e Boa Vista/RR, num trecho de 120 km na reserva indígena “WAIMIRI ATROARI”. Entretanto, não é difícil encontrar, lá ou em outros locais, pessoas conduzindo veículos falando uma estranha língua que não é o português, muito menos outro qualquer dialeto indígena local. Fato bem conhecido há tempos pelas autoridades.
Tive a satisfação de conhecer gaúchos que, atraídos por incentivos locais e pelo baixo preço das terras, migraram há décadas para lá na esperança de construir uma nova fronteira agrícola no norte do país, como o dr. Benaion, veterinário de Santa Maria que chegou à região ainda na década de 70, como integrante do Projeto Rondon, permanecendo lá até então.
Faço este relato pessoal, aproveitando a oportunidade do tema para despertar em todos, mesmo aqui no extremo sul do Brasil, que nossa dimensão continental e a manutenção de nossas riquezas foram fruto do sacrifício de gerações que nos antecederam. E não nos é dado o direito de não continuar preservando o Brasil, para entregá-lo íntegro às nossas gerações futuras. Assim, nossas riquezas, aí incluída a biodiversidade amazônica, têm que ser exploradas com responsabilidade ambiental, é claro, mas em favor de nosso povo, da melhoria de vida da nossa gente.
Por isso, muito me decepcionaram as últimas declarações dadas à imprensa pelo secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério de Meio Ambiente, Bráulio Dias, de que, segundo ele, o governo federal está “de mãos atadas” diante da escalada da coleta ilegal de material genético da biodiversidade brasileira e a falta de um marco regulatório torna inviável o combate à biopirataria. Gostaria apenas de lembrar ao ilustre secretário que tais fatos foram previstos por muitos, mas ignorados por questões ideológicas e tantas outras mais e hoje infelizmente a sociedade brasileira paga por atitudes geradas por incompetência e irresponsabilidade de alguns políticos.
Na Amazônia, tínhamos um lema que era inscrito no final de todos os documentos produzidos e exclamado patrioticamente em reuniões e que, em minha opinião, deveria ser difundido e cultivado por toda a sociedade brasileira, pois defender e preservar a Amazônia e sua biodiversidade não é privilégio dos militares, mas de todos nós que amamos a nossa pátria: “A Selva nos une, a Amazônia nos pertence”.
*Coronel do Exército R/1, advogado e presidente da Liga de Defesa Nacional Núcleo Rio Grande