Analogias entre táticas de combate e administração viram tema de cursos de especialização.
Por Adm. Vinicius Costa Formiga Cavaco
Por Adm. Vinicius Costa Formiga Cavaco
Rafael Sigollo
Embora tenha o dinamismo, a criatividade e a inovação entre suas principais qualidades, o mundo dos negócios está estruturado em ideias desenvolvidas há cerca de 2.500 anos. Segundo a lenda, foi nessa época que o general chinês Sun Tzu escreveu "A Arte da Guerra", que até hoje figura nas listas de 'best-sellers' mundo afora e é o livro de cabeceira de inúmeros executivos e líderes corporativos.
A analogia entre as estratégias de combate e táticas de guerra ensinadas por Sun Tzu com a administração de empresas e gestão de pessoas não é um exercício raso. Afinal, muito antes de usarem terno, gravata e iPad, os líderes da antiguidade já estudavam questões como liderança, trabalho em equipe, logística, análise do ambiente e do inimigo, conquista de territórios, motivação e engajamento.
"Não há fenômeno de maior complexidade do que a guerra. Os conhecimentos necessários na preparação de um conflito bélico podem ser aplicados em qualquer outro segmento e se encaixam perfeitamente no mundo corporativo", afirma Antonio Luiz da Costa Burgos. General da reserva do Exército, atualmente ele coordena o curso de estratégia militar para a gestão de negócios, uma pós-graduação da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), em São Paulo, que iniciou sua terceira turma.
Além de matérias como geopolítica, planejamento estratégico, confecções de cenários, inteligência competitiva e contrainteligência, o programa contempla atividades extraclasse como visitas a bases militares, por exemplo, no Guarujá e na Amazônia. "Nossos alunos ocupam cargos de gestão e os exercícios têm o objetivo de oferecer ferramentas que melhorem seu desempenho", afirma Burgos.
Ainda que representem apenas uma pequena parte do curso, esse tipo de atividade marca os participantes por tirá-los de sua zona de conforto. Recém-formado no curso, Wilson Poso Soares, de 48 anos, recorda que uma das tarefas de seu grupo era improvisar uma jangada e concluir um percurso com ela no mar. "Tivemos de trabalhar de forma unida. Além disso, um dos integrantes não sabia nadar, mas confiou e embarcou com o grupo."
Sócio-diretor da consultoria financeira WPS, Soares é formado em economia e tem um MBA em finanças. Decidiu-se pelo programa ao buscar uma especialização com foco em estratégia. "Queria fugir do conteúdo tradicional das escolas de negócios. Achei que o mundo militar poderia agregar valor à minha carreira", afirma.
Com duração mais rápida - em média cinco meses - a Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (Adesg) oferece anualmente, em todo o Brasil, o curso de estudos de política e estratégia. O programa é aberto a civis e costuma reunir advogados, engenheiros e empresários em turmas de até 80 pessoas. "Temos uma doutrina e um método para que o aluno possa decidir melhor o que fazer e como fazer", afirma Adauto Rocchetto, delegado da Adesg no Estado de São Paulo.
Segundo ele, a aplicação desse sistema é feita com sucesso no mundo corporativo e diversas empresas e bancos enviam executivos para serem treinados. "Eles passam a avaliar melhor uma conjuntura e evitam surpresas. As condições e as ferramentas mudam e é preciso desenvolver planos de defesa, de contra-ataque, saber o que está sendo feito em outros países e conhecer os próprios recursos."
Na opinião de Gerson Correia, headhunter da Talent Solution, os militares têm uma imagem positiva em países como Estados Unidos e Inglaterra, que de certa forma estão sempre em guerra ou em intervenção militar. Nesses lugares, é comum colocar no currículo a entidade e o tempo de serviço prestado. "Um ex-integrante dos Marines, por exemplo, teria o melhor treinamento para suportar pressões e manter o moral elevado da tropa", explica. No Brasil, Correia destaca que essa imagem se deteriorou um pouco - provavelmente pelos anos de regime militar -, mas que existem instituições de prestígio como o Instituto Militar de Engenharia (IME) e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
Oficial dos Royal Marines por 18 anos - espécie de elite da marinha britânica -, Damian McKinney acredita que os executivos podem aprender muito com o 'modus operandi' dos militares. Atualmente no comando da consultoria global McKinney Rogers, ele afirma que sua experiência nas Forças Armadas o inspiram a exigir sempre um desempenho de alto nível de si próprio e de seus colaboradores. "É preciso passar da estratégia para a execução, adotar uma mentalidade vencedora e fazer com que todos tenham clareza e alinhamento sobre a missão."
Para o general Burgos, falhas não podem ser aceitas, pois colocam vidas em risco. Em 2003, por exemplo, pouco antes de invadir o Iraque, o governo Bush exaltava a alta tecnologia das armas e dos equipamentos do Exército americano, o que colocaria seus soldados em uma posição confortável em relação aos insurgentes. Por um erro de planejamento, porém, as primeiras tropas entraram no país usando camuflagem para a selva em pleno deserto, tornando-os ainda mais visíveis no ambiente e na mira inimiga. "É preciso lidar com situações complexas, cheias de variáveis, mas sem descuidar dos detalhes", afirma Burgos. "Estamos acostumados a operar assim e as empresas podem ter grande vantagem usando nosso 'know how' a seu favor", finaliza.
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