16 de dezembro de 2012

MPM denuncia sargento da Marinha por incêndio na Base da Antártida. Ufa, que alívio!

Leiam a notícia publicada ontem em Zero Hora. Comento lá embaixo.

Sargento é denunciado por incêndio na Antártica
Se condenado, Luciano Gomes Medeiros pode pegar até 16 anos de prisão
Sargento Luciano Medeiros, ferido no incêndio da Base Comandante Ferraz, ao chegar ao Chile
(Imagem: La Prensa Austral)
Quase dez meses após o incêndio que destruiu a Estação Antártica Comandante Ferraz e matou dois militares da Marinha que tentaram combater as chamas, em fevereiro, o Ministério Público Militar (MPM) denunciou à Justiça, anteontem, o primeiro-sargento Luciano Gomes Medeiros, de 45 anos, pelos crimes de homicídio culposo (sem intenção de matar) e dano em instalações navais e em estabelecimentos militares. De acordo com o Código Penal Militar, se condenado, Medeiros pode pegar até 16 anos de prisão (1,5 a 6 anos pelas mortes e 4 a 20 anos pelo dano).
O processo tramita em segredo de Justiça na 1ª Auditoria da Justiça Militar no Distrito Federal, mas o jornal O Estado de São Paulo apurou a identidade do denunciado. Medeiros sofreu queimaduras nos braços e ficou nove dias internado. Segundo a denúncia do MPM, por volta das 23h30 de 24 de fevereiro, o militar decidiu transferir o combustível óleo diesel antártico (de combustão imediata) dos tanques de armazenamento para os dois tanques de serviço, cuja capacidade é de 5 mil litros cada um. Os equipamentos ficavam na praça de máquinas, próximos aos geradores de energia elétrica. Medeiros, segundo o MPM, acionou a bomba de transferência e, como a operação levaria cerca de meia hora, retornou à sala de estar da base, onde ocorria uma festa de despedida de uma veterana pesquisadora. Ele permaneceu na sala de estar até 0h40 do dia 25, quando houve uma queda de luz. O sargento se dirigiu à praça de máquinas e deparou-se com o incêndio, já de grandes proporções.
Medeiros na Antártida (foto:  arquivo pessoal)
Laudos do Núcleo de Perícia Judiciária da Marinha e do Setor Técnico-Científico da Polícia Federal, além de parecer técnico da Diretoria de Engenharia Naval, constataram que, como Medeiros deixou de encerrar o procedimento de transferência de combustível no tempo adequado, os tanques de serviço transbordaram. O óleo diesel antártico teve contato com as partes quentes do gerador de energia elétrica em funcionamento, provocando a combustão e o incêndio que destruiu cerca de 70% da base brasileira. Os laudos avaliaram o prejuízo causado pelas chamas em R$ 24,6 milhões.
Em depoimento no Inquérito Policial Militar (IPM) instaurado pela Marinha após o episódio, Medeiros disse que retornou à praça de máquinas após 20 minutos e desligou a bomba de transferência do combustível. O militar também afirmou que saiu da sala de estar antes da queda de energia para inspecionar os evaporadores do aquário, momento em que teria avistado as chamas. Entretanto, testemunhas que estiveram com ele durante a confraternização afirmaram que o sargento permaneceu durante todo o tempo na sala de estar, de onde saiu somente após a queda de energia - quando o incêndio já estava ocorrendo.
O jornal O Estado de São Paulo, que apurou as informações, telefonou nesta sexta-feira para o celular de uma filha de Medeiros e para o telefone fixo que seria da residência do militar, mas não conseguiu contato. Ninguém foi encontrado no endereço correspondente à linha telefônica. No processo que consta da página do Superior Tribunal Militar (STM), não havia identificação do advogado de Medeiros.
Zero Hora/montedo.com

Comento:
Num cenário de defasagem tecnológica, estrutura obsoleta, equipamentos de segurança inadequados, combustível (etanol) não testado, entre outras deficiências, aliadas a uma festa de despedida durante a qual foram servidas bebidas alcoólicas e há suspeita de que o alarme de incêndio tenha sido desligado, convenhamos, o erro do sargento Medeiros, constatado pelo MPM,  caiu do céu para o governo e o comando da Marinha. Senão, vejamos:

- Dias após o acidente, em 12 de março, o blog publicou denúncia do jornalista Cláudio Humberto:
Incêndio na Antártida: uso de etanol nos geradores de energia pode ter causado o acidente
Cláudio Humberto 
Antártida: etanol suspeito

Ao contrário das demais bases, que optaram pelo diesel ou por energia solar ou eólica, o Brasil usava etanol, mais explosivo, nos geradores de energia da base Comandante Ferraz, sem testes para homologação técnica. Isso pode ter provocado o incêndio que matou dois militares.

A Marinha silencia

O motogerador da base Comandante Ferraz, com etanol da Petrobras, foi acionado em janeiro pelo ministro Celso Amorim (Defesa). O projeto custou R$ 2,5 milhões. A explosão com etanol em grandes motores é mais rápida. Procurada por uma semana, a Marinha silenciou.
-  O reitor da Unisinos, Marcelo Fernandes de Aquino, declarou que a estrutura da base estava obsoleta e que “O País deveria oferecer um suporte mais adequado aos seus pesquisadores”.

- Outra notícia:
Água congelada nas mangueiras dificultou combate a incêndio na Estação Comandante Ferraz
Perguntinha básica: uma estação Antártica não deveria possuir um sistema que evitasse o congelamento da água nas mangueiras? 

- Em 21 de julho, uma notícia da Agência Estado publicada aqui dizia o seguinte:

No momento em que a base brasileira na Antártida começou a ser destruída por um incêndio, na madrugada de 25 de fevereiro, funcionários militares e civis da Marinha e cientistas de universidades brasileiras participavam de uma festa chamada Baile da Terceira Idade, na qual houve consumo de bebidas alcoólicas.
Mantida em sigilo tanto pela Marinha quanto pelo grupo de 31 cientistas que estavam na base Comandante Ferraz, a realização da festa, com bebidas como cerveja e vinho, foi investigada pelo inquérito policial militar (IPM) aberto no dia do desastre para apurar causas e responsáveis.
Como o alarme não disparou quando o incêndio começou, os encarregados pelo inquérito suspeitavam que o sistema pode ter sido desligado por ordem do comando da base. O objetivo seria não atrapalhar a festa. Na pista de dança há um mecanismo que espalha fumaça de gelo seco, como em uma boate. Os sensores são sensíveis e poderiam disparar, anunciando um falso incêndio.
Os cientistas não souberam responder nos depoimentos se os sensores foram desligados ou não, já que a decisão, se tomada, seria de atribuição militar. Alguns deles alegaram que sequer sabiam da localização do dispositivo que os desativava.
O IPM foi concluído e encaminhado em 15 de maio à 11.ª Circunscrição Judiciária Militar, "classificado como sigiloso, em atendimento ao Artigo16 do Código de Processo Penal Militar", de acordo com comunicado divulgado à noite pela Marinha. As perguntas encaminhadas à Marinha pelo Estado sobre as conclusões e a realização da festa não foram respondidas.

- Em 4 de março, publiquei no blog uma apresentação em PPT com texto do Capitão Tenente FN Geordandi Alves Barreto, formatado pelo Suboficial FN Roberto Oliveira de Carvalho, sob o título: Estação Comandante Ferraz: a verdadeira história! Lá, no slide 68, lemos:
"A estação está degradada por falta de uma manutenção aceitável. Recentemente, durante uma faina de reabastecimento de combustível, três tanques desabaram de suas bases apodrecidas, o que poderia ter causado um acidente ecológico grave decorrente do derramamento de óleo. Alguns sistemas vitais se encontram comprometidos: aguada, rede de esgotos, PROTEÇÃO CONTRA INCÊNDIOS e transferência de energia elétrica. Os módulos estão comidos pela ferrugem; equipamentos inoperantes ou funcionando naquela velha base brasileira do jeitinho; escadas perigosamente corroídas; anteparas em péssimo estado de conservação; os forros caindo aos pedaços..."
Bem, paro por aqui. O que transcrevi acima já é mais do que suficiente para afirmar: a Base Comandante Ferraz só continuava a cumprir sua finalidade por conta da dedicação e do profissionalismo de seus integrantes, pois há muito as condições de trabalho eram deficientes!  A Marinha sabia, o Governo sabia, e ninguém fez nada!
Ao contrário, procurou-se esconder os fatos, tal qual ocultou-se por dois meses o afundamento de uma chata com 10.000 litros de combustível ocorrido próximo à base e que por pouco não causou uma grande tragédia ecológica.
A possibilidade de que o sargento Medeiros seja condenado como único culpado e que se deixe de averiguar o conjunto de fatores que levaram à tragédia deve estar sendo recebida com alívio por muita gente nas esferas do poder.
Mal comparando, é o mesmo que condenar o cabo velho que faz meia dúzia de gambiarras para que sua velha viatura possa andar e depois é punido por se envolver em acidente de trânsito.
- Como uma viatura sucateada poderia estar na rua?
- Como a Base Comandante Ferraz continuava funcionando nas condições em que se encontrava?


Arquivo do blog

Compartilhar no WhatsApp
Real Time Web Analytics