BRASIL: Comprados em segredo em agosto de 2014, os caças Gripen NG adquiridos para a FAB tiveram aumento de 20%, com apenas 8 meses de negociação. Mas porque?
E por que o negócio só foi anunciado ao público no dia 27 de outubro, horas depois da reeleição da atual Presidente da República, Dilma Rousseff?
O Projeto FX-2 é um programa de reequipamento e modernização da frota de aeronaves militares supersônicas da FAB, criado em 2006 no governo do então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em substituição ao programa anterior, que era considerado problemático e pouco ambicioso. Com o novo programa, houve o acréscimo de vários requisitos, além de uma mudança nos requisitos estabelecidos anteriormente.
Em 2006 o Governo Brasileiro anunciou a concorrência visando à compra de 36 unidades de um modelo de aeronave de superioridade aérea. Enquanto o Projeto FX projetava gastos iniciais de US$ 700 milhões, o Projeto FX-2 previa inicialmente gastos de US$ 2,2 bilhões a US$ 3 bilhões, mas exigia transferência completa de tecnologia, e mais recentemente passou a incluir o requisito de direito de produção sob licença da aeronave no Brasil e de exportação para o mercado sul-americano.
Devido à repercussão dessa licitação, que pode incluir a aquisição posterior do Brasil de mais aeronaves do mesmo modelo vencedor da concorrência, essa tem sido considerada a mais importante aquisição de aeronaves militares da década na América Latina. Essa compra teria esse peso, haja vista vários países que estavam para definir suas compras adiaram suas decisões finais para esperar o anúncio da decisão brasileira. Isto porque a aeronave comprada pelo Brasil ficaria mais atraente em termos de preço, dada a economia em escala da produção de um número maior de unidades.
Após mais de dez anos de discussão, no dia 18 de dezembro de 2013, foi anunciado que o Governo Brasileiro optou pela aquisição do caça Saab JAS 39 Gripen NG em um pacote de 36 aeronaves, sendo 28 unidades do modelo Gripen E (monoplace) e 8 unidades do modelo Gripen F (biplace).
Num processo que envolveu três diferentes Chefes de Estado (Presidentes Fernando Henrique, Lula e Dilma), o anúncio realizado no último mês de outubro foi uma excelente notícia para a FAB, afinal, depois de muitos anos, estava efetivamente garantida a renovação da frota de aeronaves de caça da Força Aérea Brasileira.
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Por trás da boa notícia, entretanto, também foi anunciado que contrato de aquisição das aeronaves sofrera um aumento de preço da ordem de 20%, elevando o valor da aquisição de US$ 4,5 bilhões para US$ 5,4 bilhões.
Em dezembro de 2013, quando do anúncio da seleção da Saab como fornecedora das aeronaves, o contrato já contemplava o atendimento a todos os requisitos da FAB, incluindo as adequações do vetor no que tange armamentos e aviônica. Pelo menos, é isso que foi afirmado à época, tanto que logo após o anúncio do vencedor do certame, o Ministério da Defesa e a FAB trataram de confirmar todas as condições contratuais diante da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, fazendo uma apresentação detalhada das configurações da aeronave, compensações industriais fornecidas pela Saab (offset) e, condições comerciais, com destaque para o valor final negociado, que se afirmara ser um preço fixo.
O anuncio do novo valor causou surpresa juntos aos parlamentares brasileiros, que demandaram novas explicações do Ministério da Defesa e da FAB. A imprensa internacional também deu repercussão ao assunto, curiosamente com mais ênfase do que os meios especializados aqui do Brasil. A FAB tratou de vir a público afirmar que o sobrepreço se justificava em função “de novas configurações exigidas do fabricante”, sem, entretanto, dar maiores detalhes a respeito do assunto, o que é perfeitamente compreensível, haja vista estamos falando de itens sensíveis e que não são normalmente divulgados por questões de segurança nacional.
Para a Saab, a posição é confortável, haja vista o sobrepreço, da forma como está sendo justificado pela FAB, não transmite ao mercado a ideia de que o fabricante aumentou abruptamente os valores inicialmente negociados.
Informações vazadas a respeito desse negócio, e que já são discutidas em muitos meios internacionais, entretanto, mostram um cenário bastante diferente do que foi divulgado. Apesar do anúncio a respeito da assinatura do contrato ter sido realizado no dia 27/10/2014, horas após o TSE confirmar a reeleição da atual Presidente, o contrato com a Saab fora assinado, de fato, de forma discreta, no último mês de agosto, e mantido em segredo durante todo esse tempo.
O comando da FAB temia que, revelando publicamente que o valor aumentara, poria em risco o negócio. É preciso lembrar que àquela altura a sucessão presidencial encontrava-se indefinida, e, muito pior, os números na época indicavam que a atual Presidente poderia não ser reeleita.
O Gripen fora escolhido como tendo a proposta mais austera entre os finalistas do FX-2, assim como as necessidades de renovação da frota da FAB não eram alheias aos demais candidatos. Com base nisso, quais motivos levariam os militares a temerem pelo cancelamento do negócio caso um novo presidente fosse eleito?
Justamente o valor!
Um novo Presidente teria acesso direto a tudo que foi solicitado ao fabricante da aeronave e, portanto, viria que o contrato para aquisição do caça divulgado pela FAB como sendo o mais austero contempla exatos US$ 1,5 bilhão referentes a manutenção e aquisição de ferramental. Um acréscimo de US$ 900 milhões sobre o valor que já estava alocado para esses mesmos itens, em dezembro de 2013, quando do anuncio do vencedor do FX-2.
Como justificar esse sobrepreço quando sabemos que as ofertas concorrentes foram consideradas inadequadas à realidade brasileira justamente por razões de custo?
Os custos de manutenção/operação do Gripen não são tão austeros como fora inicialmente divulgado? Ou esse valor, apesar de estar alocado dessa forma, destina-se a algo mais?
Por que em apenas oito meses os custos de manutenção da aeronave aumentaram tanto?
Se os custos de manutenção são pertinentes, porque dizer que o sobrepreço deve-se às customizações solicitadas pela FAB (e que já haviam sido consideradas pela Saab em dezembro de 2013)?
E se o negócio foi feito com retidão, porque mantê-lo em segredo por tanto tempo?
Outro ponto que chama a atenção é o estabelecimento de uma linha de montagem nacional para construção local de 15 aeronaves.
Esses são os questionamentos a serem respondidos pelo Ministério da Defesa e pela FAB, diante de uma audiência convocada pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional.
Causa, no mínimo, estranheza que um dos mais aguardados contratos da história militar brasileira tenha sido assinado de forma sorrateira e mantido em segredo por todo esse tempo.
Há que se averiguar!
FONTE: Portail Aviation – EDIÇÃO: Cavok
IMAGENS: Internet
NOTA DO EDITOR¹: Considerando as implicações envolvidas, é natural que essas acusações sejam veementemente desmentidas, afinal a FAB não proverá evidências contra si mesma.
NOTA DO EDITOR²: Os aspectos técnicos referentes ao desempenho e qualidade da aeronave não estão questionados nesse artigo. O foco do assunto é tão somente a forma como se deu a assinatura do contrato de aquisição do vetor, e o valor do negócio.
NOTA DO EDITOR³: Registro aqui o agradecimento especial ao amigo Richelieu, que desde Estocolmo tem contribuído com o fornecimento de informações sensíveis pertinentes à essa aquisição.
cavok/montedo.com