Corte militar fez manobra para inflar salários de seus ministros
Auditoria detectou irregularidade no Superior Tribunal Militar; TCU determinou devolução de pagamentos indevidos
Fonte: Jornal O Globo
BRASÍLIA - O Superior Tribunal Militar (STM) descobriu uma forma de incrementar irregularmente os salários dos ministros da Corte, além dos pagamentos retroativos de auxílio alimentação. Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) mantida sob sigilo até a última sexta-feira, dia 31, detectou pagamentos a mais aos magistrados por meio das chamadas “diferenças individuais”, adotadas em 2005 para complementar os salários. Em sessão secreta realizada em agosto de 2012, os ministros do TCU determinaram que as “diferenças individuais” fossem extintas e que as quantias pagas indevidamente sejam devolvidas aos cofres públicos. Pedidos de devolução como esse são “raros”, segundo o procurador-geral do Ministério Público (MP) junto ao TCU, Lucas Furtado. O MP foi o autor da representação contra a irregularidade.
A manobra adotada no STM e detectada por auditores do TCU consistiu em criar um pagamento extra para evitar redução de salários a partir da adoção do critério de subsídio único. Desde 2005, magistrados só podem receber um salário único, acrescido apenas de vantagens com caráter indenizatório, como é o caso do auxílio-alimentação. Assim, se um juiz ganhava R$ 25 mil e o subsídio equivalia a R$ 19 mil naquele ano, a “diferença individual” deveria ser de R$ 6 mil. A cada aumento do subsídio ao longo dos anos, a diferença deveria ser diminuída: se o salário aumentasse para R$ 20 mil, o complemento cairia para R$ 5 mil, e assim sucessivamente, até a incorporação total. Conforme auditorias do TCU em 2007 e em 2011 — validadas em plenário em 2012 —, o STM continuou a pagar as “diferenças individuais” mesmo com os aumentos dos subsídios.
O acórdão determinou que o STM faça a “absorção” dessas parcelas aos subsídios, em valores correspondentes aos aumentos sucessivos. Além disso, o órgão deve adotar “as medidas necessárias à restituição dos valores pagos a título de diferença individual”.
STM diz que não há valor a devolver
O STM tem 15 ministros na ativa e 40 aposentados. Segundo a pesquisa Justiça em Números de 2012, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), outros 36 magistrados atuam em primeiro grau. Não há um cálculo sobre a extensão dos pagamentos indevidos. Ao analisar os contracheques dos magistrados aposentados do STM, os auditores detectaram “inserção indevida” de parcela remuneratória, “diferenças individuais” incorporadas irregularmente e complementação de proventos que elevava a aposentadoria para valores acima do teto salarial.
O acórdão do TCU é o mesmo que permitiu o pagamento de auxílio-alimentação retroativo aos ministros de tribunais superiores, como O GLOBO mostrou no último domingo. Além dos ministros de tribunais superiores, 4,9 mil juízes federais e do Trabalho foram autorizados pelo tribunal a receber o auxílio retroativo, o que significará um custo de R$ 312 milhões aos cofres públicos. Os próprios ministros do TCU permitiram a si mesmos o recebimento. O depósito de R$ 35 mil a cada um, em média, já foi feito.
Em resposta ao GLOBO, o STM sustenta que atendeu a todas as determinações do TCU. “A partir de setembro de 2009, todos os magistrados deixaram de receber a ‘diferença individual’, que foi absorvida nas alterações de subsídios ocorridas anteriormente. Não há valores a serem restituídos”, diz o STM. Auditoria em 2011, no entanto, detectou os pagamentos indevidos. O próprio STM chegou a informar ao TCU pelo menos uma incorporação da “diferença individual” à pensão de um magistrado. O TCU já encerrou o processo. Mas, conforme o órgão, isso não encerra o cumprimento das exigências. “Esses monitoramentos ocorrem alguns meses depois do acórdão, estão no plano de fiscalizações e deverão acontecer em breve”, diz o TCU.
OAB RJ/montedo.com