Comando avalia mudança nos intervalos entre períodos de serviço e descanso
Militares consideram a possibilidade de mudar jornada de trabalho de PMs - Pablo Jacob / Agência O Globo |
CARINA BACELAR, LUÃ MARINATTO E RENAN RODRIGUES
RIO - Preocupado em aumentar o policiamento nas ruas, o comando da intervenção federal na segurança pública do Rio avalia, entre outras medidas, a possibilidade de mexer na jornada de trabalho dos PMs. Parte da tropa tem escala de 24 horas de expediente por 72 de folga, e uma eventual mudança de regra alteraria intervalos entre os períodos de serviço e descanso.
O tema costuma ser tratado como um “vespeiro”: em setembro do ano passado, uma mudança na escala de serviço de PMs provocou protestos. Equipes de UPPs tiveram a folga reduzida para 48 horas — foi a maneira encontrada por oficiais para reforçar o efetivo encarregado de acabar com uma guerra do tráfico na Rocinha. Na época, a medida foi muito criticada dentro de grupos de discussões criados por policiais em aplicativos e nas redes sociais.
Também em 2017 — um mês antes da alteração na escala das UPPs —, o ministro do Gabinete da Segurança Institucional, general Sérgio Etchegoyen, criticou a jornada adotada na PM do Rio. Na ocasião, ele sugeriu uma carga mais rígida para a tropa, e justificou: “Eu nunca tive um dia de folga depois de trabalhar 24 horas”. Ontem, o coronel Roberto Itamar, porta-voz do Comando Militar do Leste, disse que, por enquanto, não foram definidas ações para reforçar o policiamento nas ruas, mas confirmou que a hipótese de alteração da tabela de serviço da tropa não está descartada:
— Todas (as medidas) podem ser trabalhadas para melhorar o policiamento. Inclusive as escalas, fluxos de folgas, licenças e pessoal cedido. A PM está realizando um estudo e vai apresentar conclusões. A gente quer que a própria corporação proponha melhorias. Ainda não sabemos como isso pode acontecer.
PRESIDENTE DE ASSOCIAÇÃO RECLAMA
Hoje, a jornada de serviço varia de acordo com a função. Quem trabalha com policiamento motorizado à noite dá expediente de 12 horas e folga 48. O policial que vai para as ruas a pé tem oito horas de serviço e descansa no restante do dia. Há ainda a escala tradicional, de 24 horas por 72. Para Vanderlei Ribeiro, presidente da Associação de Cabos e Soldados da PM, uma eventual alteração nesse sistema traria grandes prejuízos à tropa:
— O policial tem necessidade de estar bem preparado fisicamente e psicologicamente. São pessoas que trabalham armadas, sujeitas a muito estresse, que saem de casa sem saber se vão voltar. Tudo isso gera tensão. Acredito que o objetivo de uma eventual mudança nas escalas de serviço seja colocar mais gente na rua, mas é necessário respeitar a folga do PM, que, muitas vezes, acaba sendo convocado em regime de urgência. São sacrificados. Todo esse quadro provoca riscos, adotá-lo seria é uma irresponsabilidade.
Ribeiro também disse que uma redução do horário de folga do policial militar prejudicaria o programa Segurança Presente, para o qual parte da tropa trabalha quando não está de serviço.
— Estamos falando de um trabalho feito por PMs durante suas folgas. Como ficaria o programa? — questionou o presidente da Associação de Cabos e Soldados, que criticou o comando da intervenção por considerar a possibilidade de mexer na jornada da PM. — É muito fácil o camarada que está dando ordens, que não está sujeito àquela mesma escala, chegar e definir como será. É preciso escutar a tropa. Isso foi feito ao longo desses estudos? Em qualquer atividade profissional, quem está na ponta tem que ser ouvido.
INÍCIO DE VISTORIA EM BATALHÕES
Oficiais do Exército foram ontem ao 14º BPM (Bangu), dando início a uma série de visitas aos batalhões do estado — cada um deverá ser vistoriado durante uma semana. Comandados pelo chefe do gabinete da intervenção, general Mauro Sinott, os militares começaram a levantar as condições de trabalho da tropa. O coronel Roberto Itamar esteve presente, e disse que “muitas soluções passam por reestruturação ou outras medidas que não se configurem exatamente em despesas”.
Um momento de constrangimento marcou o início da fiscalização: na apresentação da comitiva do Exército, o comandante do 14º BPM, coronel Marcus Vinícius dos Santos Amaral, deu ordem para a tropa, perfilada, bater continência, mas parte dela não se mexeu. Em seguida, ele gritou “todo mundo”, e só assim foi obedecido. Pouco depois, ao ouvirem “descansar”, os policiais imediatamente acataram a ordem.
Também ontem, o coronel Luís Cláudio Laviano, que esteve à frente do Batalhão de Operações Especiais (Bope) em 2014, tomou posse como comandante-geral da PM. Em seu discurso, ele disse que “não há solução mágica para problemas complexos”, mas frisou que, unida, a tropa será capaz de superar os desafios da segurança do Rio.
O Globo/montedo.com