Marinha faz operação de guerra para desmontar estação antártica no prazo
Destroços de incêndio do ano passado têm de ser retirados até março.
Cerca de 200 homens trabalham no local inóspito.
Eduardo Carvalho
Homens da Marinha trabalham em obras na Antártica(Foto: Eduardo Carvalho/G1) |
A Marinha do Brasil instalou uma verdadeira operação de guerra para limpar os destroços deixados pelo incêndio na Estação Antártica Comandante Ferraz, em fevereiro do ano passado, e colocar no local módulos emergenciais.
Duzentos homens, sendo cem em terra, trabalham diariamente no processo de desmontagem da antiga estação e construção do Módulo Antártico Emergencial (MAE). O conjunto de contêineres abrigará pesquisadores e militares por um período mínimo de cinco anos, até que saia do papel o projeto do novo complexo brasileiro no continente. A estrutura de alta tecnologia tem um custo estimado de R$ 100 milhões.
O G1 acompanhou uma expedição da Marinha até o local, que começou na segunda-feira passada (4). Os viajantes se reuniram em Punta Arenas, no sul do Chile, de onde os marinheiros, pesquisadores e jornalistas decolaram em um avião Hércules C-130 da Força Aérea Brasileira na última quinta-feira (7), rumo à base militar Eduardo Frei, também chilena, que fica na Península Antártica.
De lá, o grupo de militares e cientistas seguiu com o navio Ary Rongel até a Baía do Almirantado, represamento da água do Mar Antártico cercado por montanhas encobertas de neve e geleiras imensas. Um lago de água salgada banha a área, que é considerada território brasileiro na Antártica. No local, um aglomerado de contêineres brancos e vermelhos é visto entre a paisagem gélida e branca.
Operação de guerra
Chegada à Estação Comandante Ferraz (Foto: Eduardo Carvalho/G1) |
É só quando o bote conduzido por mergulhadores se fixa nas pedras da praia, com blocos de gelo e ventos que deixam uma sensação térmica de -10º C, que se constata uma verdadeira operação de guerra montada em uma das regiões mais inóspitas do planeta.
Equipamentos pesados voltados para a construção civil – como empilhadeiras, guindastes e outras máquinas – tentam dar uma cara de “reconstrução” em meio aos entulhos de aço retorcido ainda presentes da antiga estação. O incêndio que destruiu boa parte da base matou dois militares.
Mais de 700 toneladas de aço, que formavam os blocos da antiga construção já foram retirados e levados para o navio alemão Germânia, que ronda a baía aguardando novas remessas de lixo. O material deve ser todo enviado de volta ao Brasil a partir do dia 26 de março, prazo final para término da “faxina geral”. A partir de abril, o fim do verão torna impossíveis quaisquer medidas para operar na região.
Barracas como dormitórios
A 31ª Operação Antártica, que está dentro do Programa Antártico Brasileiro (Proantar) começou em outubro passado. Desde então, homens como o capitão Paulo Cesar Galdino de Souza, chefe da operação logística na estação Comandante Ferraz, têm passado noites e dias preocupados em entregar tudo no prazo. Ele conta que a limpeza da área passou por uma série de dificuldades, como a remoção de 60 mil metros cúbicos de neve que encobriam a antiga estação e o frio constante de 1º C – agravado pela sensação térmica de -12º C.
“Demoramos dez dias para limpar a neve da área e tivermos que dormir duas noites em barracas, devido ao mau tempo”, conta o militar, que deve permanecer na estação até meados de abril, quando termina a operação.
Complexo provisório
Os contêineres brancos, trazidos na última semana pelo barco argentino San Blas desde Punta Arenas, no Chile, já começaram a ser montados onde funcionava o heliponto da estação. Até a sexta-feira (8), momento em que a reportagem do G1 estava presente na estação Comandante Ferraz, ao menos cinco contêineres estavam posicionados. No interior deles era possível observar lâmpadas já instaladas e portas divisórias de ambientes.
Até o final de março, 39 “caixas de metal” serão agrupadas e formarão um abrigo provisório que dará continuidade aos trabalhos de pesquisa e observação da região – atualmente parte desenvolvidos de forma improvisada nos navios Ary Rongel e Almirante Maximiano, parte tocados em contêineres que pertencem ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Atualmente, em terra são utilizados espaços que antes abrigavam equipamentos receptores de dados meteorológicos e informações sobre o clima. Mas agora, servem de abrigo para que militares utilizam a internet e o telefone – que funcionam precariamente no local.
Esta movimentação é acompanhada pelos militares e engenheiros Ricardo Ferreira e Carla Costa. Os dois contam que a estação provisória funcionará por um tempo mínimo de 5 anos, até que saia do papel a nova estação, que tem custo estimado de R$ 100 milhões (incluindo todo o processo logístico).
Eles afirmam ainda que uma das preocupações dos engenheiros é interligar o sistema de tratamento de esgoto do MAE. Segundo eles, o objetivo é ter “impacto zero” em relação dos detritos humanos na natureza. Além disso, a água utilizada na estação será coletada de dois lagos existentes na ilha Rei George – local que sedia a estação. “Toda a água consumida deverá ser reutilizada”, explica Carla.
Destroços deixados pelo incêndio de fevereiro de 2012 ainda estão na Antártica (Foto: Eduardo Carvalho/G1) |
Pegada ambiental
A avaliação do impacto ambiental causado pelo Brasil em Comandante Ferraz está sob a responsabilidade de Marcelo Amorim, coordenador de atendimento a acidentes naturais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama).
Além de analisar o andamento da retirada do entulho, ele tem a função de verificar os danos causados pelo incêndio da estação brasileira à biodiversidade da Antártica. Amorim chegou à estação na última sexta-feira e deve permanecer no local por mais uma semana. Outras duas técnicas do Ibama já estiveram no local realizando levantamentos sobre o assunto.
“Havia muito material químico nos laboratórios da estação. Esses resíduos podem ter escorrido para o mar. Desde outubro nosso pessoal tem ido para a estação com objetivo de avaliar onde os resíduos da antiga estação podem ser colocados e como devem ser procedimentos futuros”, conta Marcelo ao G1.
Ele explica ainda que é cedo para avaliar um dano ambiental na região, mas amostras do solo e da água foram recolhidas e levadas ao Brasil para analisar a possível existência de contaminação.
Custos
A operação de desmonte da estação Comandante Ferraz é custeada pela verba de R$ 40 milhões liberada pela presidente Dilma Rousseff do ano passado. No entanto, o transporte dos módulos emergenciais pelo navio argentino não está incluso. De acordo com Galdino de Souza, o governo brasileiro pagará apenas o combustível gasto pelo navio – número que não foi divulgado pelos oficiais.
G1, da Antártica/montedo.com