Presidente do grupo Terrorismo Nunca Mais, o general da reserva Valmir Azevedo critica a Comissão Nacional da Verdade e se diz assustado com a passividade dos atuais comandantes das Forças Armadas
Ronaldo Pelli
Presidente do Ternuma, General Valmir Fonseca Azevedo Pereira |
Em 1998, um grupo de civis e militares da reserva e reformados, descontentes com a posição das autoridades em relação às questões relativas à ditadura civil-militar, resolveu se juntar e fundar uma organização não governamental para propagar a “verdadeira história da revolução de 1964”. Nascia o Terrorismo Nunca Mais (Ternuma), cujo nome lembra o de outra instituição, o Tortura Nunca Mais, que se posiciona do outro lado do espectro político.
Presidente do Ternuma, o general Valmir Fonseca Azevedo Pereira, ou apenas general Azevedo, se diz insatisfeito com a atuação dos “atuais comandantes das instituições militares”, chamando-os de coniventes e passivos.
Ele também faz uma grande explicação sobre as diferenças entre guerrilheiros e terroristas, sugerindo que o grupo do Araguaia não poderia ser considerado como “guerrilheiro”: “não merecendo, pois, o tratamento previsto na mencionada Convenção de Genebra”.
Veja a entrevista completa abaixo.
REVISTA DE HISTÓRIA - Como o senhor, hoje em dia, ainda vê os guerrilheiros que lutaram contra os governos nas décadas de 1960 e 1970?
General Valmir Fonseca Azevedo Pereira - Na sua maioria como jovens ideologizados pela doutrina comunista, a qual seguiam orientados pelo MCI [Movimento Comunista Internacionalista]. Hoje permanecem firmes no seu projeto de tomada do poder, não para o atendimento de qualquer ideologia, mas por interesse pessoal, visto que assim usufruirão das benesses advindas do poder absoluto; hoje, no poder patrocinam um revanchismo explicito, em especial para atingir aqueles que com denodo e dedicação impediram que atingissem o poder através da luta armada – as Forças Armadas.
RH - Como o senhor acha que os atuais integrantes das Forças Armadas enxergam o período?
GA -Inexplicavelmente, os atuais comandantes das instituições militares parecem coniventes com o que está ocorrendo. Sua passividade assusta.
RH - O senhor acha que há alguma diferença entre os termos "guerrilheiros" e "terroristas"? Se sim, qual?
GA -Sim, há nítidas diferenças entre guerrilha e terrorismo, bem balizadas pelo Direito Internacional. Os guerrilheiros são amparados pela Convenção de Genebra e por organismos de direitos humanos de entidades internacionais, desde que atendam a algumas condicionantes, como a existência de uma zona liberada sob seu controle, a existência de uma causa, expressa em seu ideário, de chefes, de uniformes, de armamentos, de bandeira, etc, etc (diga-se que o terrorismo não é a sua finalidade, mas também, algumas vezes, fazem uso do mesmo). O exemplo atual é o das Farc, da Colômbia. Diga-se que no Araguaia, o bando do PCdoB que lá se instalou não pode ser considerado, jurídico-militarmente, como um movimento guerrilheiro: observe-se que não teve o reconhecimento nacional nem internacional, de órgãos jurídicos específicos, não merecendo, pois, o tratamento previsto na mencionada Convenção de Genebra.
RH- E o terrorismo?
GA - Já o terrorismo não possui nenhum apoio do Direito Internacional, a não ser de organizações de determinados países, sendo considerado como método criminoso hediondo, sendo as suas ações cruéis e sanguinárias, condenadas por todo o mundo democrata. O “guerrilheiro” pode ser visto como um civil que cooptado por uma causa luta contra o poder do Estado, que conta com os seus instrumentos para combatê-los, principalmente as suas forças militares. A opção pelo terrorismo é terrível, pois é executada por indivíduos incógnitos, evidentemente descaracterizados, que não possuem fardas ou qualquer meio que os identifiquem e o seu objetivo é causar pânico, levando o caos para a sociedade.
É a forma mais cruel e desumana de atuação. Seus seguidores desprezam as mínimas regras de humanidade e justificam a sua insanidade por algum propósito, ideológico ou não. Por isso, não estão preocupados que inocentes sejam atingidos, mesmo que o seu alvo seja a destruição de instalações ou de pessoas do governo. Nos dias de hoje, é politicamente incorreto lembrar que os guerrilheiros comunistas eram violentos. Quanto à repressão que os enfrentou e que os tinha como único alvo de sua ação, diferentemente deles próprios que, por atos de terrorismo, faziam vítimas indiscriminadamente entre a população brasileira. Os terroristas, hoje, posam de vítimas para dissimular o seu fanatismo, seus equívocos, sua violência e a sua intenção de transformar o Brasil em uma grande Cuba.
RH - Como o senhor vê a lei da anistia promulgada em 1979?
GA -Com projeto do Presidente João Figueiredo, o Congresso Nacional aprovou, em 28 de agosto de 1979, a Lei nº 6683, conhecida como "Lei da Anistia", a qual permitiu que os comunistas que mataram, sequestraram e roubaram pudessem voltar ao país e integrar-se à vida política nacional.
No geral, foi um instrumento de perdão, promovido principalmente pelo governo à época, que excluindo os criminosos reconhecidos, concedia anistia aos combatentes dos dois lados.
Mas recordo que o objetivo era atender aos que estavam lutando pela implantação do comunismo no Brasil e haviam fracassado, permitindo o seu retorno pacífico ao seio da sociedade. Para eles é que a Lei da Anistia estava dirigida.
Cumpre destacar que a linha que hoje clama pela mudança da Lei da Anistia era muito mais severa e parcial, pois pretendia atingir diversas pessoas que, julgavam, poderiam obstar suas pretensões futuras. O governo, conscientemente, não aceitou.
“Comissão da Verdade é como um imposto, não gostamos, mas temos que engolir”
RH - E, mais recentemente, o processo de reparações e indenizações? E, ainda mais recentemente, o processo de formulação e implementação de várias comissões chamadas da verdade?
GA -Na prática tornou-se altamente compensador financeiramente ser subversivo. Sabemos que o governo já despendeu mais de R$ 4 bilhões em reparações e indenizações, e recordo que além do Governo Federal, diversos estados também concederam e concedem aquelas reparações, aumentando o benefício financeiro para indivíduos que pretendiam a tomada do poder à força, pelas armas.
Pela Comissão de Anistia já passaram centenas de pretensas vítimas que, no futuro, junto da Comissão da Verdade repetirão ou aumentarão suas declarações, não rebatidas por ausência do contraditório; pelo contrário, por certo corroboradas por outros, também queixosos. Tal situação concede veracidade a qualquer alegação. Pois nos arquivos da anistia devem existir relatos pungentes, tanto que a Comissão de Anistia foi prodiga em ressarcir com vultosas verbas, os reclamantes.
Portanto, o que já foi escrito, anotado, gravado está lá. No entanto, não basta, agora é divulgar ao publico os depoimentos para torná-los uma tremenda espada de terror.
Está formada uma perniciosa rede – quanto às vítimas do outro lado, nada a comentar.
Sabemos que na época da repressão havia um acordo de sempre alegar - se ter havido tortura - era uma boa proteção para a possibilidade de delação, mesmo assim, alguns foram “justiçados”.Isto tudo ocorre, apesar de a decisão do STF de não revisar a Lei da Anistia – podemos concluir que os propósitos estão além de buscar culpados, que não poderão se defender. A finalidade é manter o assunto na pauta e acuar os agentes da repressão, em particular as Forças Armadas, como atualmente ocorre na Argentina, por exemplo.
Hoje, a Comissão da Verdade é um fato, é como um imposto, do qual não gostamos, mas temos que engolir e pagar. A criação da Comissão da Verdade faz parte do castigo imposto a uma parte da sociedade. Na verdade, mais um imposto de uma série que parece não ter fim.
Ditadura, época de guerra
RH - O senhor acha que vivíamos em uma guerra nesse período entre 1964 e 1985? Se sim, o senhor acha que na guerra vale tudo? Mesmo, inclusive, a prática de tortura?
GA -Sim, vivíamos uma guerra, na qual os agentes da repressão combatiam um inimigo infiltrado, armado, desconhecido e usando falsas identidades. Como militar destaco que nas Escolas Militares aprendemos que na guerra existem limitações estabelecidas pela Convenção de Genebra, que preconizam o respeito ao inimigo, em particular ao aprisionado.
Era um combate difícil, no qual os agentes tinham como motivação a manutenção da Lei e da Ordem; o outro lado assaltava, sequestrava, assassinava e praticava atos de terrorismo. Na refrega morreram oponentes dos dois lados e, o pior: inocentes foram vítimas, feridos ou mortos por atos dos terroristas por estarem nas imediações de seus crimes.Logicamente, existem as técnicas de interrogatório na busca de informações sobre o inimigo, e elas podem ser obtidas de diversas formas, que dispensam a pratica de torturas.
RH - O senhor é a favor da abertura dos documentos militares para pesquisas externas?
GA -Os documentos existentes de acordo com a Lei foram postos à disposição para pesquisas.
Revista de História/montedo.com