Lei anistiou PMs que fizeram greve em 12 estados entre 1997 e 2010.
Policiais ainda podem ser punidos por crimes previstos no Código Penal.
Tahiane Stochero
Os policiais militares em greve na Bahia, que já receberam intimação da Justiça para retornar ao trabalho, mantêm movimento considerado ilegal, afirmam especialistas ouvidos pelo G1. A greve fere o regimento que regulamenta a atividade militar e os envolvidos podem responder pelos crimes de motim e insubordinação, dentre outros. Para não sofrerem sanções, os líderes grevistas baianos buscam anistia – garantia de não serem punidos – como já foi concedida para outros estados por uma lei federal.
Grevistas podem responder aos crimes de motim e insubordinação do Código Penal Militar
A professora de Código Penal Militar e doutora em direito Ester Kosovski aponta que greves e paralisações são consideradas ilegais pela esfera militar. “Em uma democracia, a greve é facultada e nem sempre ilegal. Mas funcionários públicos e militares respondem a regimes diferenciados devido às imposições de suas funções. Os militares, assim como bombeiros, respondem ao Código Penal Militar, em que estão passíveis a outros crimes, além dos que o civil comete e que está previsto no Código Penal”, explica ela.
É por isso que os manifestantes exigem a anistia para encerrarem a greve na Bahia. Este precedente foi aberto pela Lei 12.191, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em janeiro de 2010 quando policiais e bombeiros de 12 estados e do Distrito Federal foram anistiados de punições recebidas por participar de movimentos reivindicatórios entre 1997 e 2010. Em 2011, a presidente Dilma Rousseff estendeu esta anistia a 439 bombeiros do Rio de Janeiro que participaram de uma greve através da Lei nº 12.505.
Ao participarem de uma greve, os PMs podem ser responsabilizados por crimes de motim e insubordinação, previstos no Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969). O artigo 182, que trata do amotinamento, prevê pena de reclusão até três anos aos "cabeças" e detenção de até dois anos para quem participar. Oficiais que se abstiverem de tomar alguma providência também podem ser punidos. Já a desobediência, prevista no artigo 163, pode levar à detenção de até dois anos, caso não haja implicações maiores, diz a lei.
A anistia concedida em lei é apenas para a greve e as punições do Código Penal Militar, diz a professora. Os grevistas ainda poderão responder pelos crimes do Código Penal, como incêndio de ônibus e assassinatos, além de processos administrativos internos da corporação, pelos quais podem até ser expulsos.
“O que está ocorrendo na Bahia é que, além da greve, há vandalismo e ações criminosas intimidando a população. A anistia não é em relação aos crimes do Código Penal, mas só em relação à greve em si e para casos de manifestação pacífica e reivindicatórias de categorias essenciais do serviço público que não poderiam parar. Ações desordeiras com atos ilegais devem ser punidos”, explica a professora Ester.
Secretário Nacional de Segurança Pública no governo de Fernando Henrique Cardoso, José Vicente Filho acredita que a anistia concedida pela lei federal em 2010 “só faz aumentar a quantidade de movimentos grevistas deste tipo pelo Brasil”.
“A crença na impunidade só faz com que o problema continue e a situação se agrave”, afirma. “Anistiar a greve no meio militar permite que visões sindicalistas persistam estimulando comportamentos assim, que soam à baderna”, acrescenta ele.
Na manhã desta terça-feira (7), o governador da Bahia, Jaques Wagner, disse que não concederia anistia aos PMs, afirmando que isso seria "um salvo-conduto" para atos criminosos.
Paralisações
A greve na Bahia foi precedida de paralisações da categoria em outros estados. Nos últimos anos, grupos busca no Congresso Nacional a aprovação da PEC-300, projeto que estabelece um piso nacional para PMs e bombeiros no país.
Desde o início do governo Dilma Rousseff, movimentos grevistas de PMs irromperam no Piauí, Maranhão, Ceará, Paraíba e Rondônia, estados em que os governadores tiveram de pedir o reforço da Força Nacional. Assim como ocorre agora na Bahia, nas crises ocorridas em Rondônia e Maranhão, em 2011, e no Ceará, em janeiro deste ano, o Exército foi designado para assumir a segurança pública estadual.
Isso só ocorre em casos de exceção através de uma portaria publicada no Diário Oficial União e só autorização da presidência. Pelo texto, as Forças Armadas recebem a missão de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e as forças estaduais, como as polícias Civil, Militar, bombeiros e as guardas municipais, ficam subordinadas a um oficial general militar.
Movimentos reivindicatórios também emergiram no Corpo de Bombeiros (Rio de Janeiro) e na Polícia Civil (Ceará, Alagoas e Paraíba). Pará e Amazonas registraram protestos de policiais em 2012, para fevereiro, associação de soldados cogitam paralisações no Rio de Janeiro, Espírito Santo e Distrito Federal buscando a aprovação do piso pela PEC 300.
PEC 300
Em entrevista ao G1 na segunda-feira (6), o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), afirmou que a greve dos policiais militares na Bahia não servirá de pressão para que a Câmara vote a PEC 300. A proposta de emenda constitucional que estabelece o piso aos PMs está em tramitação na Casa há mais de três anos, mas o governo teme que, caso ela seja aprovada, os estados e municípios não consigam arcar com a despesa extra e a repassem para o Executivo federal.
“Eu acho que uma coisa não tem nada a ver com a outra [greve e votação da PEC 300]. O tema da remuneração dos servidores públicos estaduais precisa ser discutido nos estados. Os estados são o lugar onde devem ser debatidos e discutidos a remuneração dos servidores públicos estaduais sejam eles públicos, estaduais, municipais. Nós não podemos trazer de forma nenhuma esse debate ao Congresso Nacional", disse o presidente do Congresso na segunda-feira.
Nesta terça-feira (7), a assessoria da presidência da Câmara informou que não há previsão no orçamento deste ano para reajuste salarial de nenhuma categoria.
G1/montedo.com