16 de abril de 2012

Jovens dormem na calçada para fazer alistamento militar no RJ

'Guerra' para pegar senha do alistamento militar no Rio

Diogo Dias
Jovens enfrentam nove horas de fila, dormem na calçada e, às vezes, saem de mãos vazias
Na Praça Seca, jovens dormem na calçada à espera da abertura da Junta Militar de Jacarepaguá | Foto: Diogo Dias / Agência O Dia

A madrugada nem começou, e os primeiros jovens já começam a montar acampamento na Praça Seca, Jacarepaguá. Preparados para enfrentar uma ‘guerra’, logo recebem a companhia de dezenas de adolescentes. Todos têm a mesma missão: conseguir a senha para o alistamento no serviço militar obrigatório após até nove horas de espera. Na sexta-feira, um deles que dormia na calçada foi acordado por um ovo atirado em sua perna.
A partir de carta enviada pelo leitor Josias Barbosa, o ‘Repórter X’ acompanhou durante dois dias o sufoco dos jovens na Junta Militar de Jacarepaguá. Muitos estão lá pela segunda, terceira ou até quarta vez. Ao relento, enfrentam a insegurança da madrugada.
Primeiro da fila na madrugada de sexta-feira, J., 18 anos, chegou pouco depois da meia-noite e ficou sem dormir para garantir o lugar. Depois, esperou até as 10h para preencher formulário: “É a terceira vez que venho. Nas outras, cheguei às 3h e não consegui senha. Como está acabando o prazo, vim mais cedo” . Jovens contaram que, diariamente, são distribuídas 80 senhas.
Nem todos têm a mesma disposição e acabam dormindo na calçada. “Peguei papelão no lixo para forrar o chão. Fiquei receoso com as baratas, mas estava caindo de sono e não resisti. Viram até rato aqui. Falta respeito com quem vem se alistar para servir o País”, critica F., 17, morador de Jacarepaguá.
Já E., 17, foi alvo de ‘ovada’ enquanto dormia sentado na calçada. “Sujou minha calça e os documentos que vou entregar. Pior que não vai dar tempo de passar em casa para trocar de roupa antes do trabalho. É absurdo o que temos que passar aqui”, reclama. J., 17, que se revezou com dois amigos. Um vigiava enquanto os outros dormiam. “É muito escuro e não temos segurança”.

Nova espera até o segundo ‘round’
Entrada de agência bancária é usada como abrigo para os que enfrentam a fila da Junta da Praça Seca | Foto: Diogo Dias / Agência O Dia
A fila da senha acaba por volta das 7h, mas a batalha continua: os jovens precisam voltar à Junta Militar entre 10h e meio-dia para preencher formulário. A maioria espera dormindo na praça em frente. “Não aguentei e tirei um cochilo no banco. Vou trabalhar depois e precisava descansar um pouco”, explica R., 21.
O tamanho da fila varia conforme a Junta em que o jovem vai se alistar, mas ele só pode recorrer à unidade mais próxima de sua casa. Na Junta de Bangu, também é preciso madrugar. “Cheguei às 5h30 e tinha 20 pessoas na minha frente”, comentou Rafael, 17.

Punições para quem não ‘cumprir a missão’
Homens brasileiros que não se alistam no serviço militar obrigatório sofrem restrições como não poder prestar concurso público, se matricular em universidades ou tirar passaporte. Aos 23 anos, o garçom E. ainda tenta se alistar. Ele procurou a Junta de Jacarepaguá em anos anteriores, mas nunca conseguiu a senha. Agora, quer o certificado de reservista para fazer concurso:
“Vim duas vezes antes de completar 18 anos, mas não consegui. No dia que cheguei cedo, avisaram que não teria expediente. Só voltei agora para conseguir tocar a minha vida”.
O alistamento deve ser feito nos primeiros seis meses do ano em que o brasileiro completa a maioridade. Quem perde o prazo, paga multa de R$ 1,46 por ano de atraso.
Em nota, o Ministério da Defesa diz que a responsabilidade pelo atendimento é das prefeituras e que elas são orientadas a preparar estruturas adequadas à demanda. Por problemas que considera pontuais, o Ministério tenta aproximar o alistamento militar do eleitoral. Já a Prefeitura do Rio argumenta que houve grande aumento de procura e que está fazendo levantamento do atendimento nas Juntas para distribuir melhor os servidores.
Nesta seção, o jornalista vivencia a situação alvo da reportagem. Na maioria das vezes, não se identifica como repórter.
O Dia OnLine/montedo.com

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