Caça às oportunidades
Compra de 36 jatos pela FAB deve desencadear novo ciclo de negócios e avanço tecnológico para a indústria aeronáutica nacional.
Guilherme QUEIROZ
Silva, da Akaer: a empresa trabalha no desenvolvimento da fuselagem do jato Gripen NG, da sueca Saab |
Os desfiles de 7 de Setembro têm como ponto alto uma demonstração do poderio da Força Aérea Brasileira (FAB). Nos últimos anos, essa exibição está entregue aos veteranos F-5 – jatos com quatro décadas de serviços prestados à Aeronáutica. Defasados tecnologicamente e antieconômicos, os velhos caças já tiveram sua aposentadoria decretada. Seus substitutos devem ser conhecidos em junho, mês em que se espera, enfim, um desfecho para o projeto F-X2 de renovação da frota que garantirá a supremacia aérea nacional. Tanto quanto pela FAB, a compra de 36 modernos aviões é aguardada com expectativa também pela indústria de defesa nacional. Espera-se que, nos próximos dez anos, o setor seja incorporado à linha de produção da vencedora da disputa travada entre a francesa Dassault, a americana Boeing e a sueca Saab.
Desde novembro de 2008, quando as três finalistas foram definidas, mais de 50 empresas brasileiras selaram acordos de fornecimento de material e desenvolvimento conjunto – de olho não só numa fatia de um contrato estimado entre R$ 6 bilhões e R$ 10 bilhões, mas também na oportunidade de participar do que pode ser o maior ciclo de crescimento e inovação tecnológica do setor nos últimos 30 anos. A participação da indústria nacional é um dos pontos centrais das regras estabelecidas pelo projeto F-X2. Além de ser receptor de tecnologias sensíveis dos caças, o setor de defesa deve assumir algumas etapas da produção das aeronaves.
“Esperamos que a indústria aeronáutica dê um salto semelhante ao desenvolvimento do AMX”, afirma Afonso Pierantoni, vice-presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Defesa (Abimde), referindo-se ao caça desenvolvido pela Embraer, em conjunto com a Alenia Aeronáutica e com a Aermacchi, da Itália, na década de 1980, e que continua em operação na FAB e na Força Aérea italiana. Apesar de contratos do F-X2 ainda serem apenas uma possibilidade para a maioria das empresas, para a Akaer, de São José dos Campos, no interior de São Paulo, o programa já é uma realidade. Há quase três anos, a empresa de engenharia trabalha no desenvolvimento da fuselagem do Gripen NG. No início da parceria, 30 engenheiros foram enviados à sede da Saab, na Suécia, onde passaram seis meses trabalhando nas pranchetas.
“A transferência de tecnologia é feita no desenvolvimento conjunto do produto”, afirma César Augusto da Silva, CEO da Akaer, que obteve na Saab 35% de seu faturamento de R$ 17,5 milhões, no ano passado. Os grandes grupos também estão de olho nas encomendas dos fabricantes de caça. A Atech, empresa controlada pela Embraer, especializada na integração de sistemas, deve se beneficiar como principal responsável pela evolução de sistemas embarcados no avião sueco. Segundo Tarcísio Takashi Muta, presidente da Atech, o F-X2 abre uma janela cada vez mais rara no mercado mundial de defesa. “À medida que as nações percebem que o conhecimento é estratégico, fica cada vez mais difícil abrir espaços para absorção de tecnologias”, diz Muta. Cada uma a seu modo, as concorrentes tentam minimizar as especulações de que a transferência de tecnologia será parcial, e não irrestrita, como estabelece o F-X2.
A Dassault promete capacitar engenheiros para absorver tecnologias e iniciar a fabricação do Rafale no País, a partir da sétima unidade, com progressiva nacionalização da aeronave. “É uma parceria que vai além da indústria”, afirma Jean-Marc Merialdo, diretor do consórcio Rafale no Brasil. A Saab, por sinal, propôs que a Embraer seja sócia do projeto e fabricante de partes relevantes do futuro Gripen NG e inaugurou, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, um centro de pesquisa e inovação. “Nossa proposta é de parceria de longo prazo, trabalhando num projeto juntos”, disse Bengt Jáner, diretor da Saab no Brasil. Na mesma direção, a Boeing anunciou a criação de um centro de pesquisa global em São Paulo. “Nossos principais fornecedores também farão sua parte, produzindo no Brasil”, diz Christopher Raymond, vice-presidente de estratégias e desenvolvimento de negócios da Boeing.
Isto É Dinheiro/montedo.com