O autor é um jornalista 'das antigas', que foi, inclusive, assessor de imprensa do Marechal Costa e Silva. Vivenciou, portanto, os fatos aos quais se refere.
Embora discorde de alguns pontos, em linhas gerais, sua análise é válida, do ponto de vista de alguém que está do lado de fora do Portão das Armas. Vale a leitura.
O Portão das Armas está fechado
Carlos Chagas
Jornalista Carlos Chagas (Foto: Wikipédia) |
Houve tempo em que políticos sem voto viviam rondando os quartéis, buscando sensibilizar os militares para seus interesses, suas artimanhas e suas malandragens. Eram chamados de vivandeiras, conforme os próprios militares, mas não raro tiveram sucesso. Com o fim do regime castrense, em 1985, saiu pelo ralo essa prática abominável.
Hoje, 28 anos depois, não há registro do retorno àquelas distorções. Os militares encontram-se vacinados contra o germe das quarteladas estimuladas de fora, tanto quanto contra ilusões a respeito de poderem, de dentro, corrigir mazelas peculiares à nossa sociedade. Os generais de agora não participaram do movimento responsável pela quebra das instituições não propriamente democráticas, mas assim supostas. Eram, no máximo, cadetes. Ou nem isso.
Guardam, os chefes militares de hoje, ressentimentos por conta de as forças armadas até agora permanecerem confundidas com os erros, desacertos e lambanças de antes. Aliás, causados pelo despreparo e até a ambição de maus líderes.
O importante a ressaltar, ainda num período de feridas mal cicatrizadas, está em que a chamada classe política, mesmo apresentando os mesmos vícios de todos os tempos, deixou de voltar-se para os quartéis como forma de compensar a falta de apoio popular. A banda podre sempre presente nos partidos e nas organizações das elites carece de meios para sensibilizar os militares. Menos por haver a guerra fria internacional saído pelo ralo, mais porque em nada resultaria a repetição das artimanhas do passado, senão o descrédito dos cidadãos fardados,que disso tem consciência. O Portão das Armas está fechado a incursões ideológicas, políticas ou meramente malandras.
A pergunta que se faz, assim, é a respeito de como se desenvolve o pensamento militar. Em que estruturas se assenta, agora renovado e imune a influências de minorias saudosistas de velhinhos inconformados com a perda de poder. Caberá à implacável natureza das coisas sepultar o resquício quase histórico de uma época que não voltará mais.
Os novos militares, no entanto, para onde se voltam, além de suas obrigações funcionais? Que visão dispõem da nação, além de sua fidelidade à Constituição e aos poderes constituídos?
Engolem sapos em posição de sentido quando responsabilizados pelo que não fizeram, mas tem consciência de desenrolar-se diante deles um futuro em tudo e por tudo diverso das teias do passado. O comunismo mergulhou nas profundezas, mas as causas que o fizeram emergir permanecem as mesmas. À vista de todos está a dominação de nações, de castas e de interesses que, para sobreviver, sufocam grande parte da Humanidade. Não há que servir a elas, como serviram tempos atrás. Muito menos entregar-se às suas determinações, pois o adversário, se existia, não existe mais.
Pode estar surgindo em nossas forças armadas, sempre mais integradas na população, cada vez menos provenientes das elites, um sentimento capaz de abrir novos horizontes. Como vaticinou um dos comandantes desses tempos modernos, ao referir-se à Amazônia, chegará um dia em que nossos guerreiros se transformarão em guerrilheiros. Entrar, eles entram, mas não sairá nenhum...
Cláudio Humberto/montedo.com