Carlos Chagas
Jânio Quadros, nos fugazes sete meses em que exerceu a presidência da República, ordenou ao Estado-Maior das Forças Armadas a elaboração de um plano para invadir as Guianas, começando pela francesa. Chegou a convocar o então governador do Território do Amapá, Moura Cavalcanti, para liderar a face civil da invasão. A renúncia frustrou o que seria uma guerra de conquista que facilmente venceríamos.
João Goulart mobilizou a Marinha para enfrentar navios de guerra franceses em rota para o Brasil, empenhados em defender a ação predatória de pesqueiros franceses sobre as lagostas encontradas na plataforma continental do Nordeste. Prevaleceu o bom senso quando o general De Gaulle mandou voltar do meio do caminho um porta-aviões e duas fragatas. Poderiam ser afundados.
Garrastazu Médici autorizou o III Exército, no Rio Grande do Sul, a preparar a invasão do Uruguai através de três vertentes, caso o general Líber Seregni, candidato da Frente Ampla, vencesse as eleições. Não foi necessário porque as esquerdas perderam no voto, mas chegar a Montevidéu seria questão de dias.
A Amazônia constitui-se no mesmo objeto
de cobiça internacional de sempre
Ernesto Geisel foi mais comedido. Diante da proposta do ministro Shigeaki Uéki para celebrarmos um contrato com a Bolívia, visando abastecer-nos de gás, rejeitou dizendo não estar disposto a mandar o Exército invadir aquele país ao primeiro sinal de rompimento do acordo por parte dos bolivianos. Mas estávamos preparados, ainda que a gasolina para nossos tanques fosse suficiente apenas para dois dias de progressão.
É diferente a geopolítica nos tempos atuais, porque apesar de atritos recentes verificados nas fronteiras amazônicas, não passa pela cabeça de ninguém botar a tropa na rua dos nossos vizinhos. Mesmo assim, quando um grupo das FARC invadiu território brasileiro, organizou-se um contingente militar no próprio local, tendo sido passados pelas armas diversos guerrilheiros venezuelanos.
Esses episódios se contam a propósito de os nossos governos, mesmo os do PT, estarem descuidando da necessidade do reaparelhamento mínimo das forças armadas, porque a ameaça, agora, é outra. A Amazônia constitui-se no mesmo objeto de cobiça internacional de sempre. Só como absurdo se imaginará divisões de “marines” entrando pela nossa floresta a dentro ou pulando de paraquedas nas principais cidades da região. Até porque, se assim fizessem, prevaleceria a importância de nossos guerreiros transformarem-se em guerrilheiros. Em quinze minutos as forças invasoras controlariam os centros vitais amazônicos, mas com uma peculiaridade: entrar, entrariam, mas não sairia um só. Não foi de graça que anos atrás um grupo seleto de coronéis do Exército permaneceu longa temporada no Vietnam, colhendo ensinamentos e doutrina sobre como reagir a invasões tecnologicamente muito superiores.
O fundamental é dispormos do mínimo para a reação. Coisa que vem sendo descuidada desde o governo Fernando Henrique, passando pelo Lula e chegando a Dilma. A instituição castrense não tem nada a ver com monumentais erros praticados no passado por maus chefes ou por chefes ingênuos. Em especial porque os generais de hoje nem aspirantes eram, quando da ditadura militar. Negar instrumentos e estruturas compatíveis ao exercício da missão das forças armadas, mais do que revanchismo, é burrice.
Não estamos escrevendo aleatoriamente ou por falta de assunto. Há sinais, na realidade mundial, de que crises globais acabarão respingando aqui nos trópicos, não se sabe exatamente como. Precisamos, pelo menos, de um pequeno guarda-chuva, já que galochas estão fora de moda...
Cláudio Humberto/montedo.com