Gélio Fregapani
Observando a deformação psicológica inoculada nos ocidentais pelo excesso de otimismo das últimas décadas, comparamos e constatamos que antes da I Guerra Mundial a Europa e o mundo civilizado nadavam em análogo otimismo. Nunca a Europa tinha vivido um tempo tão longo e tão pacífico como o da Belle Époque que culminou no malfadado 1914. Acreditava-se que o enriquecimento dos países e a multiplicação dos intercâmbios comerciais afastava a hipótese de um conflito geral. A final, a guerra destruiria a prosperidade de todos, e portanto ninguém quereria. Pregava-se que a humanidade caminhava para uma reconciliação universal, que eventuais atritos ficariam restringidos no espaço e se resolveriam com tratados diplomáticos e/ou comerciais, mas naquele ano, “o inimaginável aconteceu”. E quase aconteceu na recente anexação da Crimeia pela Rússia, por mais justa que consideremos.
Também pareceu que o inimaginável nunca aconteceria quando um terrorista servio, Gavrilo Princip, assassinou o herdeiro da Coroa Austro-Húngara em Sarajevo, 28 de junho de 1914. Tudo fazia crer que o crime se resolveria a nível local. Mas os eventos se sucederam em cascata. Em quatro anos, os grandes impérios centrais tinham ruído, milhões de homens tinham perecido nas trincheiras, e Europa jazia em meio a destroços fumegantes. Hoje Vladimir Putin encarna o fervor nacionalista que serviu de faísca em 1914. E o separatismo ucraniano mostra a periculosidade do irredentismo nacionalista,
A I Guerra Mundial inaugurou o ciclo de catástrofes contra o qual Nossa Senhora veio advertir o mundo se não fazia penitência dos maus costumes. Ela não foi ouvida, a Rússia espalhou seus erros por todo o mundo, desencadeou a II Guerra Mundial aliada à Alemanha nacionalista, e agora parece estar soprando um incêndio universal a partir da Ucrânia.
Dificilmente um povo brioso abandona seus nacionais massacrados no estrangeiro. Os EUA ampararam os seus no Texas, o nosso Brasil fez o mesmo no Acre. A Alemanha nos Sudetos e em Dantzig (só o covarde Lula abandonou os brasileiros no Paraguai e na Bolívia). É possível que uma reação russa à Ucrânia em defesa de seus nacionais se estenda a nações vizinhas como a Polônia e os Países Bálticos. A NATO despacharia tropas e jatos de guerra, que teriam como contrapartida um acirramento da belicosidade russa. A Polônia espera o pior
As peças do dominó estão dispostas para uma ir derrubando a outra em série e nem os EUA ficariam indenes.: “o inimaginável pode acontecer. Aliás, quase aconteceu agora na Criméia”.
No Pacífico os atritos entre a China e o Japão raspam o conflito. Um ultimato pode acontecer. Na fronteira da Estônia a Rússia concentra quantidades anormais de tropa. Uma faísca, uma advertência mal ouvida por alguma das partes e a Terceira Guerra Mundial começa.
Certamente pode não acontecer. Mas, paz não é igual a pacifismo. Se os campos europeus estão semeados de caveiras é porque o continente olhou para a guerra com repulsão e achou que nunca aconteceria.
O sistema internacional não parece especialmente estável e está menos previsível que em 1914. O falso pacifismo europeu não tem contrapartida em Moscou ou Pequim. Ainda menos nas potências islâmicas.
Um realismo bem colado na realidade, que alguns podem confundir com o pessimismo, talvez teria sido melhor para a paz e para a sobrevivência de milhões de homens.
PS: Este assunto, extraído e resumido de vários artigos na internet me trouxe a lembrança que durante a Guerra das Malvinas o General Octávio Costa, veterano da FEB- comentou para nós, seus subordinados, que quando saiu aspirante se ouvia falar da guerra na Europa da mesma forma que se estava falando das Malvinas, e que seis meses depois ele já estava nos campos de batalha da Italia.
Agora estamos falando da Ucrânia -Serve como advertência.GF