10 de fevereiro de 2016

Gélio Fregapani: as frentes contra o Exército e o recrutamento dos futuros oficiais

O recrutamento e a formação de futuros oficiais baseados somente nos méritos intelectuais apresenta numerosas contradições com a disciplina militar prestante.

Duas frentes contra o nosso Exército
Gelio Fregapani*
Uma é de inspiração anglo-saxônica. 
Sua mensagem :: -“ É desnecessário e inconveniente o fortalecimento militar. Devemos reagir é com diplomacia contra qualquer tipo de intervenção armada internacional. O Brasil deve aprender a usar a inteligência ao invés do violência. Ademais, isto de estrangeiros cobiçarem a Amazônia é uma paranoia; muito mais fácil seria uma invasão pelos marcianos. Por que gastar com defesa se existem coisas mais importantes? Poderíamos até nos orgulhar que a nossa região norte seja patrimônio da humanidade"

A outra frente é inspirada pelo “Foro de São Paulo”. 
Sua filosofia é comunista e revanchista: -“Não confiamos nos militares, pois eles são fascistas por natureza. No passado, na Guerra Fria acompanharam os gringos e agora querem dar uma de nacionalistas. Dizem que estão no desmanche e precisam de meios para defender a Pátria, mas armá-los seria uma temeridade para o democracia ( quer dizer: para o comunismo)”.
Um dos métodos de ambas as frentes é o aviltamento salarial dos militares. O Foro de S. Paulo tenta também racializar as Forças Armadas, via "cotas" raciais na admissão às Escolas Militares, apagando o processo do mérito em concursos, e ainda propugna a revisão ideológica dos currículos. Ambas as "frentes"sabem que o alerta militar é verdadeiro, que riquezas e debilidade militar atraem ambições e desgraças, apenas não se importam. Parecem não saber que, quando um corpo morre, ambos os braços morrem.

Sobre o recrutamento dos futuros oficiais
Gostem ou não os partidários da igualdade universal, em todos empreendimentos e em todos os exércitos tal como em todas as empresas haverá comandantes e comandados. Em todos, mas principalmente nos exércitos em combate o sucesso será influenciado em larga medida pelo acerto das decisões dos comandantes e pela eficiência em incutir entusiasmo e garra às seus comandados, seja qual for o escalão tratado.
Em um período de guerras continuas a seleção dos oficiais é ditada por seu desempenho em combate, mas em longos períodos de paz nem sempre os parâmetros são adequados. Este preâmbulo é necessário em face da notícia que o Governo deseja introduzir um sistema de cotas na seleção para a Academia Militar, em substituição ao sistema de mérito intelectual, mediante concurso.
Há algumas décadas, como chefe de uma assessoria de pesquisa de pessoal, colhemos alguns dados históricos que podem trazer algumas luzes sobre tão importante assunto.
No tempo do Império havia dois tipos de seleção. Numa delas, a hereditária, os filhos de oficiais eram nomeados Cadetes e prestavam serviços desde tenra idade. A outra forma foi a seleção através do sucesso nos combates. O primeiro método produziu excelentes oficiais, cujos exemplos familiares incluíam os conceitos ancestrais de honra e lealdade, comprovados no longo trato dos assuntos militares.
O nosso Caxias é o exemplo mais emblemático das virtudes desse tipo de seleção, as quais ainda se notam diluídos vestígios ainda hoje. O segundo método foi a seleção natural em guerras contínuas que sempre deu certo em todos os cantos do mundo e esta forneceu-nos incomparáveis líderes como Osório, só para exemplificar. A minha geração ainda conviveu com destacados oficiais oriundos da FEB.
Então chegou a vez da República que, com ideais positivistas, decidiu recrutar os futuros oficiais pelo mérito intelectual (agravado por favorecimentos ideológicos). Como o efeito das mudanças não é imediato o corpo de oficias se dividiu entre os doutores (gostavam de ser chamados assim) e os tarimbeiros, oriundos dos sistemas anteriores, os quais foram pouco a pouco diminuindo de número. Na verdade os tarimbeiros eram caudilhos oriundos da aristocracia rural gaúcha com suas virtudes e defeitos, mas se sabia que estariam sempre a frente nos combates.
Quanto aos doutores, eram de pouca utilidade guerreira. Excetuando Rondon em missões de paz, os positivistas forjaram pessoas honestas (nem sempre), brilhantes matemáticos, ideológicos fanáticos e pacifistas apátridas amantes da paz e da fraternidade universal. Guerreiros, nunca. Cultivavam a disciplina, sim, mas como um fim em si mesma, não como uma forma de coordenar esforços. Podemos atribuir-lhes as vergonhosas campanhas de Canudos e Contestado, cuja herança ainda assistimos no "affair" da Raposa-Serra do Sol. Como exemplo dos doutores citamos Benjamin Constant, mentiroso e traidor e dos fanáticos ideológicos o cruel e incompetente Moreira Cesar, responsável pela maior derrota do nosso Exército.
Com aquele tipo de gente no comando o Exército praticamente se anulou, mas reagiu; oficiais foram a Alemanha, criou-se uma "Missão Indígena, Veio a Missão Francesa e finalmente a FEB, mas não se alterou a forma de ingresso ao oficialato através de concurso por mérito intelectual e é esta forma que o atual Governo cogita alterar em benefício de uma classe social que julgam ser mais afeitas ao socialismo. Algo lembra os positivistas que proclamaram a República baseados em mentiras.
O fato é que o recrutamento e a formação de futuros oficiais baseados somente nos méritos intelectuais apresenta numerosas contradições com a disciplina militar prestante. De uma forma estereotipada, os rapazes com verdadeiro espírito guerreiro não costumam ser estudiosos nessa fase da vida, de forma que à maioria dos que ingressam, embora estudiosos, são carentes de vocação guerreira.
É verdade que os oficiais que ingressaram mediante concurso se mostraram mais conscienciosos e ponderados do que os antigos caudilhos, mas como grupo tem demonstrado menor capacidade de decisão, provavelmente por serem, na maioria, oriundos de uma classe média que subiu por esforço através do estudo, pouco afeitos ao risco e a atitudes que possam causar prejuízos na carreira.
É verdade que os rapazes das classes mais humildes ainda têm maior dificuldade em concorrer com os das classes médias, mas a popularização do ensino tem propiciado cada vez mais o ingresso dos primeiros, inclusive de expressivo número de negros, o que joga por terra qualquer argumento em favor de cotas.
Bem, isto não invalida o fato que a seleção por concurso intelectual afasta a maioria dos realmente vocacionados, atraindo muitos que apenas desejam um emprego seguro e que na primeira oportunidade farão novo concurso para outro órgão melhor remunerado. Com o sistema de concurso estamos recebendo rapazes estudiosos, mas isto pouca coisa é além de um ornamento. Estamos comprando quadros pela moldura, brilhantes pela armação e pistolas pelo coldre. Todos necessários mas secundários.

Bem, e daí? 
Apontar defeitos é muito fácil, mas e as soluções?
No Centro de Estudos de Pessoal do Exército temos (ou tínhamos) a disposição testes psicotécnicos que podem indicar a personalidade adequada para qualquer função. É só escolher as qualificações desejadas e medir a vocação militar e darmos um peso no mínimo igual ao exame intelectual. Alguém lembraria como são diversas as funções dentro de um exército, mas tem muitos aspectos comuns, entre eles a coragem física e moral, a disciplina, a iniciativa,e honestidade e a lealdade. Certamente o leitor acrescentaria algumas mais. Pode ser difícil mas não impossível, mas é só querer.
Querer é poder, diz o ditado. Mas não basta querer, é preciso saber (e nós sabemos). Também não basta saber, é preciso fazer. Contudo, para fazer é preciso QUERER.
Que Deus inspire o nosso Exército na busca do rumo certo
* Escritor e coronel da reserva do EB, atuou na área do serviço de inteligência na região Amazônica, elaborou relatórios como o do GTAM, Grupo de Trabalho da Amazônia.

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