29 de julho de 2016

Militares pressionam para que Justiça comum não os julgue

Antônio Werneck - O Globo

RIO — Uma reivindicação das Forças Armadas, como contrapartida por novamente atuar no Rio com poder de polícia, está em vias de ser votada no Senado. É o projeto de lei que impede o julgamento de militares na Justiça comum por crimes contra civis até o fim deste ano em todo o país, incluindo o período da Olimpíada, dos Jogos Paralímpicos e das eleições municipais.
O projeto estabelece que crimes dolosos contra civis praticados pelos militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, na vigência de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), sejam apreciados e julgados só pela Justiça Militar.
Polêmico, o projeto foi aprovado em regime de urgência no início do mês pela Câmara. De autoria do deputado federal Esperidião Amin (PP -SC), tem caráter provisório: vale até 31 de dezembro deste ano. O Tribunal Superior Eleitoral pediu o uso das tropas do Rio durante as eleições.
Militares ouvidos pelo GLOBO admitiram que trabalharam nos bastidores para que a proposta fosse aprovada na Câmara antes do recesso. Queriam a mesma urgência no Senado, mas não conseguiram. O pedido de urgência não foi aprovado pelos senadores, e o recesso praticamente sepultou as chances de aprovação antes da Olimpíada. Mas eles ainda esperam que a proposta tenha validade nas eleições.
Apesar do foco no Rio, a lei valeria para todo o país. Amin disse que o objetivo do projeto é dar uma garantia às Forças Armadas. Afirmou que, embora seja de Santa Catarina, conhece “a situação excepcional que o Rio atravessa, tanto na questão de gestão administrativa e como na violência urbana”. Segundo Amin, o temor de ser julgado pela Justiça comum pode levar um militar a “fugir de uma situação de flagrante”.
O deputado reconheceu que o projeto, se aprovado, é um “arremedo”:
— É um improviso na lei penal. É ruim, mas é melhor que não fazer nada. Por outro lado, um militar inseguro na sua missão representa um enfraquecimento no esforço coletivo de empregar as Forças Armadas no policiamento ostensivo do Rio — afirmou.
O subprocurador-geral da Justiça Militar Marcelo Weitzel Rabello de Souza disse que as Forças Armadas estão sendo usadas na GLO com muita frequência para resolver questões que não são de sua natureza:
— O emprego das Forças Armadas em GLO se banalizou. É usado no combate à violência urbana, no enfrentamento do tráfico de drogas, para mediar conflitos de índios. O problema é que ninguém sabe hoje qual é a regra do jogo. E isso gera insegurança jurídica na tropa. Na minha opinião, o foro competente é a Justiça Militar, mas há outros que pensam diferente — afirmou.
Ex-procurador da República, o professor Daniel Sarmento, titular de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio (Uerj), tem opinião distinta. Para ele, o projeto “viola a Constituição, que só admite o julgamento pela Justiça Militar de crimes de natureza tipicamente militar”.
— A mudança é incompatível também com pacífica jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que já assentou que a Justiça Militar não pode jamais julgar casos que envolvam a violação de direitos humanos de civis.
EXTRA/montedo.com

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