Eleição presidencial foi suspensa após denúncias e protestos tomam o país.
Instabilidade política impacta decisão da ONU de sair do país em 2016.
Tahiane Stochero
Do G1, em São Paulo
O general brasileiro Ajax Porto Pinheiro, que comanda as tropas da ONU na missão de paz no Haiti, diz que a situação é incerta no país.
Na última semana, o segundo turno das eleições presidenciais foi suspenso após denúncias de fraude, e uma onda de protestos violentos a favor e contra o governo tomou as ruas de várias cidades.
O Conselho Eleitoral suspendeu as eleições alegando razões de segurança. Com a indefinição, um governo provisório deve assumir em 7 de fevereiro, quando termina o mandato do atual presidente, Michel Martellyx.
Na última semana, no entanto, o presidente da Comissão Eleitoral e outros quatro de seus nove membros renunciaram, o que torna incerto como será a continuidade do processo eleitoral. Há o risco de haver um vácuo de poder a partir do fim do mandato de Martellyx.
Em entrevista ao G1, o oficial diz que espera que os políticos cheguem logo a um acordo, "para que o país possa dar o próximo passo".
Pinheiro afirma não ver relação direta entre as causas da instabilidade política e a previsão da ONU de encerrar em 2016 a Missão para Estabilização do Haiti (Minustah). Apesar disso, afirma ele, a situação de segurança do país influenciará a decisão do Conselho de Segurança – que será tomada em outubro – de manter ou não a operação internacional.
A ONU planejava retirar, a partir de 15 de outubro, os últimos 2.370 militares que possui na Minustah. A missão foi criada em 2004, após uma onda de violência e manifestações levar à deposição do presidente Jean Bertrand Aristide. Desde então, o Brasil possui o maior número de soldados e comanda militarmente a missão.
“A situação hoje é de distensão, com muito atrito político. Não há consenso (entre governistas e opositores). Como tem um clima de atrito, leva a uma tensão na segurança. Os protestos são rotina: bloqueiam as ruas, queimam pneus, atiram pedras”, afirma o general Ajax Pinheiro.
"Se me perguntassem há um mês se eu acreditava que a Minustah sairia em outubro (de 2016) e as eleições transcorreriam normais, eu diria que sim, que acreditava que era outubro, porque tudo estava caminhando bem. Com este impasse, a situação é bem incerta e nem me arrisco a prever um futuro desenlace da missão agora”, diz Pinheiro. “Tudo pode acontecer.”
O Conselho Eleitoral alegou falta de segurança para suspender as eleições em 22 de janeiro, após o candidato da oposição, Jude Célestin, exigir a investigação de suspeitas de fraudes no primeiro turno, realizado em outubro de 2015, e recusar-se a participar da continuidade do pleito.
“Este é o momento para todos voltarem à mesa de negociação e acreditamos que haverá em breve acordo. E quanto mais rápido isso se definir, melhor para o futuro do país. Uma situação política instável não é boa para ninguém. Vamos nos preparar para a próxima fase, que não sabemos qual vai ser e nem quando vai ser. Acreditamos que eles chegarão a um acordo”, diz o general Ajax Pinheiro.
Adiamento das eleições
Para o oficial, havia condições das eleições terem sido realizadas conforme o planejado - o segundo turno presidencial estava marcado para 24 de janeiro.
“Sim, tinha situação (de segurança). Até o dia 22, era nossa avaliação integrada com a polícia local, e estávamos prontos para realizar (o pleito). Não posso dizer que no futuro não ia se deteriorar, não tinha como saber, mas até então [a situação] estava até menos agressiva do que na véspera dos outros dois turnos eleitorais que tivemos em 2015 (eleições legislativas e primeiro turno presidencial). Da nossa parte, estávamos prontos”, defende.
"O adiamento ocorreu mais porque não havia consenso político, não foi a questão da permanência da ONU. Não tem este link, eu não vejo isso hoje. A questão é política. E, da demanda deles, saem consequências, até para a segurança. Se eles fizerem um acordo, fizerem as eleições, voltamos à normalidade e saímos em outubro", afirma.
Uma comitiva de inspetores da ONU irá a Porto Príncipe, a capital haitiana, em março, fazer um relatório estratégico com elementos políticos e de segurança para embasar a decisão que o Conselho de Segurança tomará em outubro sobre o término ou continuidade da Minustah.
Segundo o general, o efetivo atual da força é o mínimo necessário para manter a ordem no país. Se houver redução deste contingente da ONU em outubro, a operação internacional terá que mudar seu caráter, pois não terá mais condições de controlar áreas críticas. A ideia estudada pelas Nações Unidas era que, com a saída das tropas, a missão passasse a ser de apoio institucional ao governo.
Em maio de 2015, Jacques Wagner, então ministro da Defesa, anunciou que o Brasil iria retirar em 2016 os militares do Haiti, cumprindo uma decisão da ONU.
O general Ajax Pinheiro pretendia ser o último a sair. Apesar de dizer que não há mais definição, ele diz esperar que o programado se mantenha.
“Eu acredito [no encerramento da missão neste ano]. Para nós seria um fator de compromisso de sucesso. A comunidade internacional diria que cumprimos bem nossa missão de garantir um ambiente seguro e estável e podemos partir", diz o general.
“Se nada mudar e tivermos condições de segurança, podemos sim mudar o perfil da missão, mas depende do Conselho de Segurança. A tendência da ONU é reduzir custos de efetivo em missões que deram certo e investir em outras mais críticas e pesadas. Mas, como será o futuro da missão, nem a ONU decidiu”, acrescenta.
G1/montedo.com