Decisão é histórica: nunca antes o exército brasileiro havia sido responsabilizado por condutas transfóbicas e homofóbicas por parte de seus agentes.
Marianna Lively sofreu perseguições e recebeu até visitas de estranhos após alistamento militar
Gustavo Miranda, A Tribuna
A Justiça Federal condenou o Exército Brasileiro a pagar R$ 60 mil de indenização para a estudante Marianna Lively, de 19 anos.
Em 2015, a jovem, que é mulher transexual, sofreu perseguição, recebendo ligações e até mesmo visitas de estranhos em casa, após passar pelo Serviço de Alistamento Militar em Osasco, na Grande São Paulo (relembre o caso aqui)
É a primeira vez que uma força armada nacional é condenada nesse tipo de ação. A decisão saiu nesta quarta-feira (6), 1 ano e 8 meses após ela ter sido fotografada por militares dentro do quartel e ter tido sua imagem espalhada pelas redes sociais. Também foram divulgados a ficha de inscrição, com nome de registro, e o certificado de alistamento — apenas militares tinham acesso aos documentos.
O caso teve repercussão nacional e, logo, as advogadas Patrícia Gorisch e Ana Carolina Borges, de Santos, assumiram a causa. Segundo a decisão, da 1ª Vara da Justiça Federal de Barueri, onde a jovem morava, ficou comprovado que o Exército é responsável pelos danos materiais e morais causados pelos agentes da corporação.
A decisão judicial afirma ter ficado claro que a dignidade da estudante foi violada. “É sabido que as transexuais são uma das minorias mais marginalizadas e estigmatizadas da sociedade. (…) Ao haver a divulgação indevida das fotos e do Certificado de Alistamento Militar, a autora passou a receber telefonemas de estranhos em sua residência, bem como ficou exposta a todo tipo de ofensas pessoais e humilhações de forma pública”, frisa a juíza Gabriela Azevedo Campos Sales.
Extremismo
Para a magistrada, como a exposição aconteceu na internet, as consequências foram ampliadas. “Observo que além da foto, o certificado de alistamento possuía todos os dados da autora, inclusive endereço e telefone, o que a tornou sujeita até aos atos de grupos preconceituosos extremistas”, cita.
Pela primeira vez, o Exército veio a público falar sobre homofobia e discriminação. Em uma nota, a corporação admitiu a divulgação, sem autorização, das informações da jovem, durante o processo do Serviço Militar Obrigatório.
Decisão inovadora
Por causa dos constrangimentos, a jovem abandonou Barueri, mudou-se para a Capital e, depois, para Londres. Segundo a advogada Patrícia Gorisch, que também é presidente da Comissão de Direito Homoafetivo do Instituto Brasileiro de Direito da Família (Ibdfam), a sentença é um marco na luta contra o preconceito. “Nunca o Exército foi responsabilizado por condutas transfóbicas e homofóbicas por parte de seus agentes”, diz.
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